Os revezes que de há uns anos para cá a política de construção e integração europeia tem sofrido devem-se à forma leviana como tem sido abordada, isto é, ao esquecimento de que o que é natural para os políticos não o é para a população. Os políticos exageram na sua confiança no humanismo, no altruísmo, na solidariedade dos povos europeus.
Uma análise primária diria que essas qualidades existiam em boa quantidade nos povos dos países que primeiro tiveram a ideia de se unirem numa Comunidade com tão elevadas pretensões, mas existiriam em quantidades cada vez menores nos povos que sucessivamente a ela foram aderindo. O que quer dizer que na Europa haveriam povos de primeira e povos de segunda.
Mas tal análise é contrariada pelo facto de dois dos povos mais velhos e sacrificados, mas também mais evoluídos da Europa, terem rejeitado o tratado da Comunidade Europeia na sua versão anterior. Os países que foram integrando a Comunidade após os sucessivos alargamentos também não são vistos nem se têm comportado como cavalos de Tróia, apostados em boicotar a construção europeia. Pelo contrário, há entre eles excelentes “alunos”.
Mas na realidade a cada nova adesão é a uma reconstituição que se procede, é uma nova vontade colectiva que se constitui. A nível dos projectos globais nunca houve alterações significativas, mas os projectos só existem para os políticos, são estes que têm que transmitir os compromissos assumidos, os outros habitantes vivem essencialmente a realidade concreta do dia a dia.
Para os políticos é fácil virarem-se para alguém e dizer “porreiro, pá”, o que não é só o descarregar de emoções acumuladas mas a confirmação de um sentimento de fidelidade na defesa de objectivos bem concretos. O problema é que para o comum dos eleitores esse sentimento custa muito mais a criar e pode não ser suficientemente forte.
O espírito europeu está cada vez mais fraco, por si só não está criando os sentimentos necessários a patrocinar uma maior coesão. Embora assente em grandes princípios, a construção europeia fez-se sempre com pequenos passos que foram incorporando durante meio século o quotidiano das pessoas dos países fundadores. Mas quando se deu a adesão de outros países, porque as diferenças eram cada vez maiores, foram necessários grandes passos que afectaram velhos equilíbrios nos novos e nos velhos aderentes.
Conseguir que as novas adesões não abalassem alicerces já antigos, ou provar que daí adviriam alicerces mais sólidos, foi tarefa que os políticos não conseguiram executar. Isto significa que quando se dão pequenos passos as pessoas confiam nos políticos, mas acham que os grandes passos não são a forma mais adequada para obter a concretização do velho objectivo de coesão, para criar uma vontade colectiva mais sólida, um sentimento europeu consistente.
Mas também há aqui uma questão que não tem nada a ver com o mérito ou demérito da forma como se quer fazer a construção europeia. Tem a ver com o momento, a ocasião em que se pergunta às pessoas se querem dar um passo em frente. Perante tantas questões que as pessoas se colocam e perante o estádio em que a construção europeia já se encontra, fazer uma pergunta daquelas é como perguntar a qualquer pessoas que já está a dar um salto sobre o abismo, e já só vê os perigos a surgirem de todos os lados, se efectivamente quer dar o salto.
O instinto defensivo, de sobrevivência das pessoas é então mais forte do que qualquer outro e até aí, por cima do precipício, se colocam a questão como se fora possível retroceder. A grande maioria pensará mesmo que o melhor é suspender a acção e dar o meio passo atrás. Pensará que já é tarde para avançar, ganhar o ímpeto necessário, porque as pessoas são por natureza pessimistas e não se vão condenar a si próprias a cair no abismo.
Havia questões que se deveriam ter posto, referendos que deveriam ter sido feitos, mas antes de entrar na Comunidade. Perguntar a cada passo que nela se dá não é racional. Um referendo capta a opinião do momento, só sendo radical na formulação da questão que se coloca, tipo quer permanecer ou sair da Comunidade Europeia, é que essa radicalidade pode suplantar o sentimento momentâneo e dar um resultado que nos comprometa e incentive.
Mas este referendo nunca se fará e o melhor é vivermos como esta espécie de pecado original que é nunca nos ter sido perguntado se queríamos aderir à Comunidade, se estávamos preparados para irmos perdendo umas fatias de soberania à medida que se vai fazendo a construção europeia. A solução estará em partirmos todos do princípio de que os nossos ascendentes já disserem que sim, o que seria óbvio.
Também nunca nos perguntaram se queríamos ser portugueses ou ibéricos e, se não fora outra razão, valeu a pena sermos portugueses pelo colorido, pela alegria, pela diferenciação que demos à humanidade e o que nós queremos, genericamente, é continuarmos a ser diferentes, mantermos as nossas particularidades e não sermos absorvidos por ninguém.
Uma análise primária diria que essas qualidades existiam em boa quantidade nos povos dos países que primeiro tiveram a ideia de se unirem numa Comunidade com tão elevadas pretensões, mas existiriam em quantidades cada vez menores nos povos que sucessivamente a ela foram aderindo. O que quer dizer que na Europa haveriam povos de primeira e povos de segunda.
Mas tal análise é contrariada pelo facto de dois dos povos mais velhos e sacrificados, mas também mais evoluídos da Europa, terem rejeitado o tratado da Comunidade Europeia na sua versão anterior. Os países que foram integrando a Comunidade após os sucessivos alargamentos também não são vistos nem se têm comportado como cavalos de Tróia, apostados em boicotar a construção europeia. Pelo contrário, há entre eles excelentes “alunos”.
Mas na realidade a cada nova adesão é a uma reconstituição que se procede, é uma nova vontade colectiva que se constitui. A nível dos projectos globais nunca houve alterações significativas, mas os projectos só existem para os políticos, são estes que têm que transmitir os compromissos assumidos, os outros habitantes vivem essencialmente a realidade concreta do dia a dia.
Para os políticos é fácil virarem-se para alguém e dizer “porreiro, pá”, o que não é só o descarregar de emoções acumuladas mas a confirmação de um sentimento de fidelidade na defesa de objectivos bem concretos. O problema é que para o comum dos eleitores esse sentimento custa muito mais a criar e pode não ser suficientemente forte.
O espírito europeu está cada vez mais fraco, por si só não está criando os sentimentos necessários a patrocinar uma maior coesão. Embora assente em grandes princípios, a construção europeia fez-se sempre com pequenos passos que foram incorporando durante meio século o quotidiano das pessoas dos países fundadores. Mas quando se deu a adesão de outros países, porque as diferenças eram cada vez maiores, foram necessários grandes passos que afectaram velhos equilíbrios nos novos e nos velhos aderentes.
Conseguir que as novas adesões não abalassem alicerces já antigos, ou provar que daí adviriam alicerces mais sólidos, foi tarefa que os políticos não conseguiram executar. Isto significa que quando se dão pequenos passos as pessoas confiam nos políticos, mas acham que os grandes passos não são a forma mais adequada para obter a concretização do velho objectivo de coesão, para criar uma vontade colectiva mais sólida, um sentimento europeu consistente.
Mas também há aqui uma questão que não tem nada a ver com o mérito ou demérito da forma como se quer fazer a construção europeia. Tem a ver com o momento, a ocasião em que se pergunta às pessoas se querem dar um passo em frente. Perante tantas questões que as pessoas se colocam e perante o estádio em que a construção europeia já se encontra, fazer uma pergunta daquelas é como perguntar a qualquer pessoas que já está a dar um salto sobre o abismo, e já só vê os perigos a surgirem de todos os lados, se efectivamente quer dar o salto.
O instinto defensivo, de sobrevivência das pessoas é então mais forte do que qualquer outro e até aí, por cima do precipício, se colocam a questão como se fora possível retroceder. A grande maioria pensará mesmo que o melhor é suspender a acção e dar o meio passo atrás. Pensará que já é tarde para avançar, ganhar o ímpeto necessário, porque as pessoas são por natureza pessimistas e não se vão condenar a si próprias a cair no abismo.
Havia questões que se deveriam ter posto, referendos que deveriam ter sido feitos, mas antes de entrar na Comunidade. Perguntar a cada passo que nela se dá não é racional. Um referendo capta a opinião do momento, só sendo radical na formulação da questão que se coloca, tipo quer permanecer ou sair da Comunidade Europeia, é que essa radicalidade pode suplantar o sentimento momentâneo e dar um resultado que nos comprometa e incentive.
Mas este referendo nunca se fará e o melhor é vivermos como esta espécie de pecado original que é nunca nos ter sido perguntado se queríamos aderir à Comunidade, se estávamos preparados para irmos perdendo umas fatias de soberania à medida que se vai fazendo a construção europeia. A solução estará em partirmos todos do princípio de que os nossos ascendentes já disserem que sim, o que seria óbvio.
Também nunca nos perguntaram se queríamos ser portugueses ou ibéricos e, se não fora outra razão, valeu a pena sermos portugueses pelo colorido, pela alegria, pela diferenciação que demos à humanidade e o que nós queremos, genericamente, é continuarmos a ser diferentes, mantermos as nossas particularidades e não sermos absorvidos por ninguém.
A Comunidade Europeia cometeu bastante o erro de querer estabelecer normas demasiado rígidas que contribuem para nos tirar a alegria que nos dá o vivermos uma certa anarquia. De certo que é mais agradável termos uma estrada larga para caminharmos por onde à sua largura nos aprouver, do que ter que seguir uma linha contínua pintada no seu meio.
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