quinta-feira, 19 de junho de 2008

Crónica Política - Os léxicos políticos de Cavaco e de Defensor

A política apropria-se das palavras como cada espécie se apropria das plantas e animais necessários para o seu alimento. Aos políticos é pressuposto que não usem as palavras fora do seu contexto pelo que todos se embrulharam num rol de acusações e desculpas quando Cavaco Silva em Viana do Castelo se referiu à raça perfeitamente fora do contexto em que a palavra terá o valor pejorativo que na política adquiriu. Ou seja fora dum contexto isolacionista do tipo de Salazar.
Mas códigos são códigos e em muitos como este não vale a pena estar a mexer. Situação preocupante será a que tem a ver com a participação dos jovens na vida política, mas isto para Cavaco Silva, que Defensor Moura a não entende assim: “A vida partidária não é escola de educação cívica que se recomende”. “Clientelismo e carreirismo” são virtualidades dum “combate político sem ética e sem lealdade, a luta sem tréguas pelo domínio dos aparelhos partidários”.
Para Defensor, sem medo das palavras, porque hoje são os políticos os seus verdadeiros sacerdotes, será melhor manter os jovens afastados deste mundo, pondo-os todos a escuteiros, aderentes aos seus esquemas de voluntariado e associativismo cultural, desportivo e ambiental. Não será isto seguir a moda de os políticos baterem em si no geral, para se eximirem às responsabilidades pessoais?
Cavaco Silva não tem partilhado desta falsa honestidade daqueles que se acham como uma das causas deste problema, seja em concreto, seja em abstracto. Nem afirmou que a atracção se faça pelos exemplos como Moura parece defender, embora Defensor se não ache ele próprio como exemplo, mas entende que os seus confrades são piores e capazes de toda a espécie de malvadezas.
Todo este tipo de afirmações são demagógicas quando na boca de um político como Defensor Moura e sinais de ignorância quando noutras bocas, sem que as tenhamos que aceitar quando manifestação de um desabafo de quem já está cansado de procurar um político com quem se identifique e não encontre.
É evidente que não existem hoje na política ídolos, gente perfeita que represente no momento a clareza de que os nossos espíritos anseiam. Mas há gente empenhada, que dá tudo o que sabe e pode para resolver os problemas nada fáceis, quer sejam herdados ou surgindo sempre, exigem uma preparação de que se não necessitava há tempos. Se os processos estão viciados, se os métodos são os que permitem os crimes é outro problema.
Talvez tenha passado o tempo em que era fácil surgir um ídolo com quem nos identificássemos porque as opções eram dicotómicas e claras. A complexidade legislativa, a sobreposição de causas de diferente natureza, o encadeamento de efeitos torna as decisões difíceis. E não se pode dizer que as opções do povo tenham estado sempre erradas, se perante tanta dificuldade o povo se apoia mais naqueles que tem mais razão na determinação das causas e subestima bastante a análise das soluções.
Homens como Defensor Moura podem fazer falta à decisão mas não fazem falta à política. Porque quando se passa a vida a dizer mal dos outros e a lançar dúvidas sobre qualidades e méritos que não são só políticos, está-se a levar as coisas para uma mudança de pessoas e não de métodos. Não se está a fazer compreender os argumentos, mas a lançar nevoeiro sobre eles.
Além de que todos nós temos noção das formas típicas e atípicas como os políticos actuais lá chegaram, não parece ser aqui que reside o problema. Ninguém chega à política perfeitamente virgem, sem contaminação de outras ambiências. Mas tudo seria diferente se quem exerce os cargos e poderes o fizesse de forma transparente, expondo-se à crítica exterior. Ora Defensor Moura é um exemplo acabado da opacidade auto-suficiente.

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