terça-feira, 7 de novembro de 2006

Os comentadores

A certos comentadores da coisa pública corre-lhes facilmente a pena para a sandice. A técnica é sempre a mesma, sem inovação e criatividade, começam por lançar cortinas de fumo, fazem falsas profecias, pintam o futuro de negro e lá vai a arrufada de insultos do costume.
O objectivo, não é de esclarecer ninguém, não é de deixar que as pessoas tirem conclusões por elas próprias, é sim de sentenciar, de chatear, qual a esperança de que alguém mude de direcção, só por, eventualmente, vir a ler coisas que só se entendem se se analisar o estado de espírito de quem as escreve.
Proclama-se que as pessoas estão a trabalhar para criar o inferno no futuro. Como a nível local as pessoas se conhecem e este discurso não passa tão incólume, estes comentaristas viram-se para o nacional. Ataca-se alvoroçadamente este ou outro qualquer governo, tanto faz.
Nada mais louvável que a pretensão de querer que os outros vejam aquilo que possivelmente não vêm. Mas tal não se consegue com um quadro previamente pintado, por mais qualidade que ele tenha, mas com a sua pintura perante os olhos de todos, para que eles saibam como pode ser criado ou pode ser evitado.
A premunição simples não é eficaz, já ninguém acredita em visionários. As pessoas já deixaram de se identificar por estados de alma.
O que se passa com estas perspectivas negativas a que as pessoas estão mais habituadas passa-se igualmente com as apologéticas. Também os reveladores de futuros risonhos agem de modo similar. Os seus ídolos fazem tudo de bem, cada passo seu é um passo para o seu e nosso céu.
A nível local muitas pessoas procedem assim e acreditam em amanhãs que cantam. Por exemplo aquelas que vêem jardins, bosques, pintassilgos e canários por todo o lado e turistas a aterrar em jactos resplandecentes no planalto de Antelas. Como a nível nacional há aqueles cujos ídolos residem mais longe, em Lisboa, e vêem os jactos com triliões de turistas a aterrar na Ota, claro.
Estes têm de fazer do passado um cataclismo e de criar um momento no tempo universal a partir do qual o Sol passou a resplandecer a todas as horas do dia. Se não houvera quem do presente já fizera esta maravilha em que vivemos, o futuro nunca seria tão magnífico como eles e só eles o vêm.
Ora nada disto é verdade, nem as perspectivas são tão negras nem tão brilhantes como muito querem fazer crer.
Que esta Câmara de Ponte de Lima não tem plano é bom de ver, quando se entende que deveria haver uma ideia consensual de qual a evolução futura do concelho, para que não houvesse informação privilegiada e hipóteses de corrupção.
Que este governo não é socialista é bom de ver, quando por socialista se entende como um distribuidor daquilo que há, mas que neste caso não há, porque não tem que haver ou porque atrás alguém colocou o que havia em certas mãos impróprias.
Que esta Câmara de Ponte de Lima sofre dos problemas de excesso de poder de que sofrem todas as Câmaras por esse País fora é bom de ver, quando sendo responsáveis pela concepção dos documentos de planeamento, são também pela sua execução. Não há uma Assembleia Municipal com poderes efectivos.
Que este governo permite a acumulação capitalista é bom de ver, mas qual o governo por esse mundo fora que não permite, mesmo os poucos que dizem o contrário, e que quando caem deixam ver toda a espécie de podridão que escondem.
Perante a dificuldade hoje existente em se ser justo, esperar-se-ia que não houvesse pretensos julgadores da história, mas efectivos construtores do futuro. Só uma sociedade de homens livres, sem cartilhas e sem manhas, poderá vir a construir um Estado sério, nem pendura e sem penduras.
A relatividade hoje existente em relação a valores e princípios que há uns anos se consideravam património inalienável de uma corrente política ou até, por extensão, da humanidade, é por demais evidente.
Também o novo enquadramento das pessoas é mais complexo do que há uns anos atrás, pela reformulação e crescimento das classes, pelas novos esquemas que as pessoas voluntariamente compartilham, pelas vitimações a que a comunicação dá origem, pela facilidade de fazer eco com a vaidade e com o choradinho nacionais.
Perante tanta turbulência é por demais importante falar para o homem comum, aquele que tem as qualidades e defeitos do homem de hoje, mas que tem a capacidade de ser o homem de amanhã.É necessário que se fomente nesse homem comum uma sadia sede de justiça e se evite ou anule uma insaciável sede de vingança.