A discussão sobre a despenalização do aborto é daquelas que após a decisão do referendo estará ainda por concluir. Não sendo agradável, infere ainda de muito cinismo e superstição. E todos estão mortos que chegue o dia da consulta, que depois tudo se esquecerá.
Ninguém se quer chatear e vai dizer tudo o que pensa. Muitos votarão sem estar convencidos. Talvez à última hora surjam argumentos novos, do género tentar apanhar os outros desprevenidos, de surpresa. Não se podem gastar já todos os trunfos e alguns só mediante o desespero virão à baila.
Para já os argumentos carreados para a discussão, sejam pró ou contra, são estanques porque já têm as evidências necessárias, e não mais que isso, espera-se que as deixem intactos e que as pessoas só tenham que continuar a vê-los assim, a pesá-los e dar-lhes a importância relativa.
Há uma tendência para reproduzir a mesma argumentação de há anos, alguma já com séculos, sem curar de ter em conta os progressos na ciência médica e nas ciências humanas, a influência que eles já exercem na vida corrente, isto é, sem uma nova abordagem civilizacional.
Quem quer que um lado ganhe cala os novos argumentos do outro. Insiste nos do seu lado, nem que sejam absurdos e incoerentes com qualquer política global de natalidade. Que isso é para depois ou para nunca mais.
Impõe-se já uma discussão aberta, que tenha por base todos os aspectos do problema e todos os papeis que as pessoas são chamadas a desempenhar durante a sua vida, não só a solução de um problema imediato.
Assim é necessário ter em conta as outras formas de reprodução existentes ou que se adivinham, o papel da genética no presente e no futuro, as diferentes formas de assumir a maternidade, de reconhecer direitos, deveres e da sua eventual transferência mesmo antes do nascimento.
É necessário que o Estado mostre que não sendo importante o embrião a abortar, dá o devido relevo e defesa aos filhos que nascem. É indigno não evitar que a violência se exerça sobre filhos indefesos, que é manifestamente mais perversa e nefasta do que eventuais abortos que não resultem da mesma.
Não repugnará a ninguém a esterilização forçada, decidida judicialmente, de quem, pai, mãe ou os dois que cometam iniquidades como as que se têm visto.
Já para quem pratique aborto, só por esse facto, de modo algum se justifica qualquer medida punitiva. O aborto só era penalizado devido à política de natalidade e pelo aspecto moral já que permitia encobrir realidades que sempre existiram e dar alguma credibilidade ao casamento ou a outras instituições existentes.
O aborto é um acto isolado que nem precisa de ser conhecido, aceite e acordado pelas duas pessoas que é pressuposto estarem na sua origem. É irrelevante o conhecimento de quem é a segunda pessoa, impossível se a primeira não quiser, mas seria esse conhecimento que permitiria tratar psicologicamente a questão, enquadrá-la em alguma forma de incentivo à natalidade, puder resolver o problema doutra forma.
No passado a maioria dos abortos só se fariam para não destruir casamentos ou, que fossem, uniões de facto, para não causar perturbação social, escândalo público. Ainda hoje estes são motivos de se querer o aborto livre e, já se percebeu, secreto. Quando o homem tem a situação mais estável o aborto é um acto injusto, penaliza eventualmente a pessoa menos culpada.
Embora os direitos e deveres de maternidade já hoje se não possam definir partindo do casamento ou até da família como sua base fundamental, no imaginário social ainda é dada grande relevo à sua defesa e a família, mesmo informal, continua a ter grande importância.
Com o casamento pretendia-se garantir uma grande estabilidade à família, o que hoje é na prática quase irrelevante. Porém à família é dada quase a mesma importância de outrora, mau grado os legisladores se vejam em dificuldade para acompanhar as suas diferentes formas de organização.
Pode-se também discutir se, caso se não trate de um problema de saúde, não havendo qualquer prejuízo anormal para a mulher, o aborto não será somente um problema social, resultante de novos valores prevalecentes.
Pode-se questionar quando a gravidez tiver resultado de adultério ou de relações livres não punidas na nossa sociedade, se o Estado deve “financiar” deste modo esse tipo de relações, dando cobertura àqueles novos valores.
Pode-se igualmente questionar quando, além do embrião em causa, haja um embrião de uma família a constituir-se, mas que de momento não está em condições de assumir a maternidade, se o Estado não deve “investir” numa futura maternidade responsável, destruindo o primeiro embrião.
Em muitos casos o aborto será a garantia de relações estáveis no casal envolvido. Mas não haverá dúvida que na maioria só dá garantias a uma relação paralela, por mais legítima que ela seja em relação à que deu origem à necessidade de abortar.
O Estado não tem que resolver todos os problemas sociais, fora assim e nada teria interesse, e a instituição do aborto livre não pode levar a que se vejam com bons olhos todos os abortos, independentemente da sua natureza terapêutica ou não, familiar ou não.
Do que não há dúvidas é que se o aborto for a solução para problemas de saúde, mesmo que de natureza psicológica, a sua legalização implicará que, à semelhança doutros actos médicos, a sua prática seja tendencialmente gratuita.
Já noutros casos, nos tais não vistos com bons olhos, é razoável colocar dúvidas. E também essas dúvidas são para colocar agora, senão quando se discutirão, que de cínicos e hipócritas está o mundo cheio. No dia seguinte a uma eventual vitória do Sim, à boa maneira, todos, incluindo os que votarem Não, reclamarão tudo de graça.
Nestas questões há sempre quem tenha definido linhas farisaicas de pensamento e relegue deveres e responsabilidades para trás das costas, fingindo que os direitos de uns nunca põem em causa direitos de outros.
Era importante que o Estado garantisse que neste caso não põem e isso até seria favorável ao Sim. Mas também que esclarecesse:
Que não é o uso que do sexo se faz que está em causa.
Que direitos e deveres podem estar em causa em relação à maternidade.
Que sistema vai integrar o tratamento da interrupção de gravidez.Que vai por cobro àquela violência que se exerce sobre os filhos já nascidos, que choram, que apelam à sociedade que lhes dê a lealdade que não recebem dos pais, ou doutros assumidos responsáveis, actuando de forma implacavelmente justa para com quem deles abusa.
Ninguém se quer chatear e vai dizer tudo o que pensa. Muitos votarão sem estar convencidos. Talvez à última hora surjam argumentos novos, do género tentar apanhar os outros desprevenidos, de surpresa. Não se podem gastar já todos os trunfos e alguns só mediante o desespero virão à baila.
Para já os argumentos carreados para a discussão, sejam pró ou contra, são estanques porque já têm as evidências necessárias, e não mais que isso, espera-se que as deixem intactos e que as pessoas só tenham que continuar a vê-los assim, a pesá-los e dar-lhes a importância relativa.
Há uma tendência para reproduzir a mesma argumentação de há anos, alguma já com séculos, sem curar de ter em conta os progressos na ciência médica e nas ciências humanas, a influência que eles já exercem na vida corrente, isto é, sem uma nova abordagem civilizacional.
Quem quer que um lado ganhe cala os novos argumentos do outro. Insiste nos do seu lado, nem que sejam absurdos e incoerentes com qualquer política global de natalidade. Que isso é para depois ou para nunca mais.
Impõe-se já uma discussão aberta, que tenha por base todos os aspectos do problema e todos os papeis que as pessoas são chamadas a desempenhar durante a sua vida, não só a solução de um problema imediato.
Assim é necessário ter em conta as outras formas de reprodução existentes ou que se adivinham, o papel da genética no presente e no futuro, as diferentes formas de assumir a maternidade, de reconhecer direitos, deveres e da sua eventual transferência mesmo antes do nascimento.
É necessário que o Estado mostre que não sendo importante o embrião a abortar, dá o devido relevo e defesa aos filhos que nascem. É indigno não evitar que a violência se exerça sobre filhos indefesos, que é manifestamente mais perversa e nefasta do que eventuais abortos que não resultem da mesma.
Não repugnará a ninguém a esterilização forçada, decidida judicialmente, de quem, pai, mãe ou os dois que cometam iniquidades como as que se têm visto.
Já para quem pratique aborto, só por esse facto, de modo algum se justifica qualquer medida punitiva. O aborto só era penalizado devido à política de natalidade e pelo aspecto moral já que permitia encobrir realidades que sempre existiram e dar alguma credibilidade ao casamento ou a outras instituições existentes.
O aborto é um acto isolado que nem precisa de ser conhecido, aceite e acordado pelas duas pessoas que é pressuposto estarem na sua origem. É irrelevante o conhecimento de quem é a segunda pessoa, impossível se a primeira não quiser, mas seria esse conhecimento que permitiria tratar psicologicamente a questão, enquadrá-la em alguma forma de incentivo à natalidade, puder resolver o problema doutra forma.
No passado a maioria dos abortos só se fariam para não destruir casamentos ou, que fossem, uniões de facto, para não causar perturbação social, escândalo público. Ainda hoje estes são motivos de se querer o aborto livre e, já se percebeu, secreto. Quando o homem tem a situação mais estável o aborto é um acto injusto, penaliza eventualmente a pessoa menos culpada.
Embora os direitos e deveres de maternidade já hoje se não possam definir partindo do casamento ou até da família como sua base fundamental, no imaginário social ainda é dada grande relevo à sua defesa e a família, mesmo informal, continua a ter grande importância.
Com o casamento pretendia-se garantir uma grande estabilidade à família, o que hoje é na prática quase irrelevante. Porém à família é dada quase a mesma importância de outrora, mau grado os legisladores se vejam em dificuldade para acompanhar as suas diferentes formas de organização.
Pode-se também discutir se, caso se não trate de um problema de saúde, não havendo qualquer prejuízo anormal para a mulher, o aborto não será somente um problema social, resultante de novos valores prevalecentes.
Pode-se questionar quando a gravidez tiver resultado de adultério ou de relações livres não punidas na nossa sociedade, se o Estado deve “financiar” deste modo esse tipo de relações, dando cobertura àqueles novos valores.
Pode-se igualmente questionar quando, além do embrião em causa, haja um embrião de uma família a constituir-se, mas que de momento não está em condições de assumir a maternidade, se o Estado não deve “investir” numa futura maternidade responsável, destruindo o primeiro embrião.
Em muitos casos o aborto será a garantia de relações estáveis no casal envolvido. Mas não haverá dúvida que na maioria só dá garantias a uma relação paralela, por mais legítima que ela seja em relação à que deu origem à necessidade de abortar.
O Estado não tem que resolver todos os problemas sociais, fora assim e nada teria interesse, e a instituição do aborto livre não pode levar a que se vejam com bons olhos todos os abortos, independentemente da sua natureza terapêutica ou não, familiar ou não.
Do que não há dúvidas é que se o aborto for a solução para problemas de saúde, mesmo que de natureza psicológica, a sua legalização implicará que, à semelhança doutros actos médicos, a sua prática seja tendencialmente gratuita.
Já noutros casos, nos tais não vistos com bons olhos, é razoável colocar dúvidas. E também essas dúvidas são para colocar agora, senão quando se discutirão, que de cínicos e hipócritas está o mundo cheio. No dia seguinte a uma eventual vitória do Sim, à boa maneira, todos, incluindo os que votarem Não, reclamarão tudo de graça.
Nestas questões há sempre quem tenha definido linhas farisaicas de pensamento e relegue deveres e responsabilidades para trás das costas, fingindo que os direitos de uns nunca põem em causa direitos de outros.
Era importante que o Estado garantisse que neste caso não põem e isso até seria favorável ao Sim. Mas também que esclarecesse:
Que não é o uso que do sexo se faz que está em causa.
Que direitos e deveres podem estar em causa em relação à maternidade.
Que sistema vai integrar o tratamento da interrupção de gravidez.Que vai por cobro àquela violência que se exerce sobre os filhos já nascidos, que choram, que apelam à sociedade que lhes dê a lealdade que não recebem dos pais, ou doutros assumidos responsáveis, actuando de forma implacavelmente justa para com quem deles abusa.