terça-feira, 3 de outubro de 2006

Viva o S. João de Arga, ó-ai-ó-la-li-ló-le-la

Eu gosto em particular do Santo Aginha. E lá vai ele, tal qual o seu companheiro São João. Os dois igualmente triunfantes nos seus floridos andores. O São João com uma cascata a seus pés.
Cada qual vai aos ombros de quatro valentes, que bem se esforçam para glória de Deus. Os restantes homens da aldeia vão ao palio e com as cruzes. As mulheres tratam do resto.
Na procissão há muitas bandeiras só na mão de mulheres, senhoriais nos seus fatos de lavradeiras. Chegada ao cruzeiro, a procissão lá vem de volta à capela deste hospitaleiro Convento que os eremitas ergueram neste sítio abrigado e acolhedor duma inóspita mas deslumbrante Serra de Arga.
Gosto dele, deste popular Santo Aginha, também denominado Santo Oginha, que eu até prefiro mais. Santo sem ser beato, intruso nos mais lídimos ficheiros canónicos, terá praticado alguns “crimes” para sobreviver. Arrependido haveria que dedicar o resto da sua vida a ajudar os outros.
O nosso Santo não seria acreditado na sua bondade. Morreu perante a impiedade humana que continuou a ver nele mais o lado “mau”, do que o seu coração de “bom” homem. Alguém se terá arrogado o direito de ser seu algoz e o colocou nestes brejos à mercê dos lobos.
O povo fê-lo Santo, que nesta terra tão agreste é difícil conceber alguém que ainda tenha alguma coisa para dar aos outros, se já há tão pouco para cada um.
A Serra de Arga é mesmo um grande maciço granítico só cortado por esta fenda virada a norte, rumo ao rio Coura e encimada pelo convento de Santo Oginha. Nas suas costas este rasgão na Serra vira a sul rumo à Montaria.
Depois a Serra tem pequenas fraldas de rochas de diferente natureza, na idade e contextura, onde se já permite alguma agricultura, como o Cerquido, as Argas de Cima, de Baixo e de S. João, Dem e Montaria. Só depois veio o minério e a partida para Lisboa e para o estrangeiro.
São os habitantes da Serra, de parcos recursos, que mais vivem a festa. Mas se ela é vivida com entusiasmo e devoção pelos que cá mais perto residem, também trás cá gente de todo o lado, até onde chega a merecida fama dos seus folguedos.
Caminha, Cerveira, Ponte de Lima e Viana são a origem do maior número de “peregrinos” que todos os anos fazem deste lugar tão recôndito o local do seu encontro e confraternização.
As rusgas que dantes chegavam cá a pé, subindo e contornando agrestes penhascos, continuam a aparecer, animando quem já cá está a juntar-se à dança.
Quem não dança canta e nas Argas há uma maneira peculiar de cantar poemas compostas com mestria, em que o último verso de cada quadra se repete, seguindo-se o refrão a que acima nos referimos.
Já há muitos anos que duas bandas de música, com as suas rapsódias de música ligeira e popular, dão ao ambiente quase familiar propiciado pelos quartéis à volta, uma euforia inusitada de quem, estando neste lugar remoto, se esquece, por estes momentos, de todas as agruras que a vida lhes possa “proporcionar”.
Pela noite dentro a festa continua, de um lado as concertinas, do outro tocam as bandas de música, umas e outras com os seus aderentes entusiastas, empolgados com os seus acordes. As palmas soam estridentes.
Se não se fica para a manhã, que haverá nova procissão para terminar a festa, regressa-se a casa, cientes que com esta animação também é um pouco mais de paz que se adquire, que o espírito necessita de se alimentar e o coração agradece.
Para o ano Santo Oginha de certo que nos terá de volta, não fosse também esta uma forma de adoração face a todos que, na sua bondade, são os incompreendidos deste mundo.