terça-feira, 17 de outubro de 2006

Uma estátua controversa e inútil

Há dez anos foi inaugurada, não posso dizer se com muita ou pouca pompa e com muita ou pouca circunstância, porque não assisti, a estátua do Sr. José de Sá Coutinho no Largo de S. João.
Houve alguma polémica acerca da imoralidade da colocação na praça pública de uma estátua oferecida pela família, sem que se manifestasse qualquer movimento de apoio. E a polémica chegou ao mérito do visado, uma personagem a vários níveis controversa.
Se esta família queria prestar uma homenagem particular, colocava a referida escultura dentro da sua propriedade, que não é tão pequena como isso, e tanto bastava.
Se a sociedade se não prestou para assumir esta homenagem é porque o visado não merecia o reconhecimento público. No tempo deste senhor os democratas prestavam homenagem aos seus amigos dentro dos cemitérios.
Se a família quis afrontar a sociedade com a sua brônzea presença na praça pública, no fundo só é mais uma de entre muitas afrontas em que esta família tem sido pródiga.
Ponte de Lima por imposição deste senhor, tal era o seu poder, só beneficiou de uma nova ponte após o 25 de Abril. No início dos anos 60, para tentar remediar o problema da travessia do rio foi, por sua culpa, feito o maior atentado ao melhor e mais antigo do nosso património arquitectónico.
A ponte romana foi desmontada pedra a pedra, foi alargada com pedra nova, cimentada, violentada. E, se se tornou possível o cruzamento de dois autocarros em cima dela, isso não resolveu qualquer problema de trânsito.
Logo à frente na ponte medieval continuou a não ser possível o cruzamento de qualquer veículo com um autocarro e várias pessoas morreram ou foram mutiladas por esse motivo, apertadas contra os amparos da ponte.
O senhor em causa procedia assim porque tinha larga influência e era um fundamentalista político e um saudosista da paisagem natural e humana, que queria imutáveis. Mas acima de tudo era mais um herói contra o progresso, nem que esse combate passasse pela delapidação do património.
Escreveu lindos roteiros, descreveu paisagens, mas a sua ambição era que tudo ficasse assim para a eternidade. Algum mérito a sua escrita terá, mas nada que lhe dê direito a pedestal, porque não criou “humanidade”.
Matas como a deste senhor estão, noutras terras, há muito tempo ao serviço da população. Em Ponte de Lima trata-se como uma “vaca sagrada” em que se não mexe. É a sombra tutelar sobre Ponte de Lima, representação do poder que lhe permitiu colocar como Presidente da Câmara um seu “escudeiro”, que mal sabia escrever.
Agora a família opõe-se à construção de um multiusos no chamado “Campo do Ciclo” porque lhe estragaria a paisagem das janelas da casa. Vendeu bem terrenos à Câmara Municipal para fazer parques de estacionamento, que os carros são baixos e não lhe estragam os miradouros.
Bem pior tem feito esta família a Ponte de Lima do que D. Teresa. Esta Senhora deu-nos direitos, outros estatuados tiraram-nos. Esta Senhora exerceu as suas funções com a legitimidade que ao tempo lhe era atribuída. Outros, sem legitimidade para tal, têm sido os senhores de Ponte de Lima.
Não se podem fazer arrazoados e não se ficar a saber se querem apear a estátua de D. Teresa por falta de mérito ou por má colocação. E ainda se não ficando a saber se lhe faltam méritos na acção política, pela qual indubitavelmente nos concedeu privilégios ou por nascimento, de que ela não é manifestamente culpada.
Como está por demais provado o nosso sangue tem as mais diversas origens. E, se nem a “nobreza” nem a “realeza” estão de todo imunes a estas miscigenações, isso não lhes tira méritos nem lhos dá.Por isso o meu protesto contra a sanha persecutório contra esta Digna Rainha. Se não a querem ver, virem os olhos para outro lado. Não será por ela, até que se prove o contrário, que Ponte de Lima está carente de Humanidade.