Há duas opiniões que correm céleres e quase a par de modo que até há pessoas que agarram nelas indistintamente e as arremessam ao primeiro que lhes aparece a querer dar algum crédito à vida pública. Uma é velha, não tão velha como possa parecer, mas tão velha que em Portugal já tem uso desde o século dezanove. Outra é mais recente, até porque só é possível depois de um período de mais abundância, mas em que a instabilidade faz temer pela perca de alguma.
A primeira opinião é de que se estraga imenso dinheiro com políticos, com gente inútil, que anda aí a gastar à grande e faz disso uma ostentação insuportável. A segunda opinião é de que se estraga imenso dinheiro com os pobres, com gente igualmente inútil, que não quer trabalhar, que está viciada em viver à custa do trabalho alheio, a quem são dados subsídios para tudo, até para “iguarias” a que outrora nem os ricos chegavam e que ainda assim exige cada vez mais.
Claro que também há quem diga que o dinheiro que se podia tirar aos políticos podia ser usado a favor dos pobres, mas não é a esta que me refiro. Também seria fácil mostrar que este desvelo pelos pobres é cada vez mais passageiro e calculista, quando o que se pretende é atacar o Estado. Aquelas duas opiniões servem de base à aversão que cada vez mais se espalha em relação aos políticos e à política e são utilizadas para mostrar que o Estado, sendo imensamente rico, é mau repartidor, é açambarcador e esbanjador de recursos.
Essas pessoas jogam com a relação directa daquelas duas opiniões, ora pondo-as em paralelo, ora fazendo depender uma da outra. De qualquer modo há uma influência mútua, cada uma delas reforça e é reforçada pela outra. Pobres e políticos atraem-se e repelem-se numa relação sempre difícil. As pessoas encontraram nestas duas opiniões os chavões a aplicar na maioria das situações de mal desempenho do Estado. Traduzem a sua condenação de um certo despesismo em que existe um toque de imoralidade, de injustiça, não em relação aos pobres, mas aos que trabalham, aos que estão na actividade produtiva.
É a sensibilidade de cada interlocutor que muitas vezes vai determinar a opinião que se transmite. As pessoas arremessam a opinião mais adequada a quem já não encontra motivo para ter “pena dos pobres” ou que sente vontade de “descascar directamente nos políticos”. Aos pobres diz-se que toda a culpa é dos políticos, do seu exagerado número, do seu excessivo rendimento. Aos ricos diz-se que a fonte de todos os males está na falta de exigência, na flacidez da disciplina, na promoção da preguiça, na exaltação do desleixo.
Já em relação aos remediados, tipo classe média, avalia-se primeiro a sua sensibilidade. Se são sensíveis à pobreza coloca-se o político na lama, caso contrário coloca-se os pobres na origem de todos os males. Se já perdeu toda a sensibilidade escolhe-se a perspectiva mais adequada ao desenrolar da própria conversa. Há sempre uma ocasião em que é fácil introduzir a crítica do dinheiro mal gasto ou do excesso de gastos nas funções políticas e nas funções sociais
Colocar um rótulo nestas ideias, apelidá-las de extremistas, dizer que são obra de pessoas ressabiadas, invejosas, é redutor e não leva a lado algum. Não com este cariz absolutista mas aplicadas a casos pontuais, ou suavizadas na sua expressão, estas ideias são utilizadas por todas as forças políticas no dia a dia da sua luta. Não as negando na prática, há que lhes encontrar o motivo, debelar as suas causas, corrigir as condições em que elas germinam, anular o seu efeito desagregador da sociedade.
A verdade é que se ouve muito político sem vergonha dizer que já deu muito ao seu partido com pouca paga, o tacho não terá estado à altura. Na sociedade pode haver funções exercidas por políticos mas são muito poucas aquelas que têm que o ser necessariamente. Muito menos pode haver duplicação de funções como se propuseram os regimes assentes em ideologias totalitárias que subdividiam as funções numa de carácter técnico e noutra de carácter político.
Felizmente que estará em desuso o pagamento a um político para dar ordens a um técnico que as vai executar. Subsistem porém um grande número de políticos em cargos desnecessários, excedentários, que ocupam hierarquias imensas com cargos sobrepostos. É naturalmente a estes desperdícios que as pessoas se referem quando criticam o dispêndio de dinheiro pelo Estado para sustentar a sua máquina e a dos diferentes partidos que nela se vão pendurando.
Com as comunicações existentes, com a literacia a um melhor nível, diminuiu a necessidade de intermediação na política pelo que um número limitado de profissionais pode gerar as bases programáticas em que se basearão as normas que alguns outros porão em execução. O povo identificaria assim melhor os responsáveis e todos os que ocupam cargos na estrutura do Estado responderiam hierarquicamente, estando aqueles políticos eleitos na cúpula.
Mas se os políticos já não têm vergonha, os “pobres” também a vão perdendo e tornam-se assim alvo fácil de crítica. O Estado gasta cada vez mais nas funções sociais, no combate à pobreza e no apoio aos mais carenciados e o efeito parece ser cada vez menor. Há quem veja aí o lado cínico da política porque entende que muitos políticos só reforçam esta função do Estado para que os mais desfavorecidos se aquietem um pouco.
Há quem pense que um sistema altamente concorrencial, quanto mais liberal ele for, mais se justifica que aqueles que tem menos oportunidades sejam apoiados pelo Estado. Outros ainda pensarão na inevitabilidade de surgirem novas partilhas do trabalho, novas tecnologias e nova organizações para responder á eficácia, à rentabilidade, enfim, à concorrência de todo o lado. E pensarão também que em todo o lado, quanto maior for a exigência para integrar sistemas de trabalho eficazes, mais pessoas sobrarão para desempenhar funções subalternas, cada vez mais mal pagas, cada vez mais carentes de apoio social.
A especialização, a pouca tolerância a ritmos de trabalho exigentes, leva a que cada vez mais franjas marginais se formem e que é necessário apoiar de alguma forma. É pois de prever que a divisão dos rendimentos venha a prevalecer cada vez mais sobre a divisão do trabalho como preocupação das pessoas e que infelizmente haja cada vez mais a pensar que é dinheiro perdido aquele que se destina a garantir o mínimo de dignidade a quem não tem outra forma de a conseguir. Mas também todos sabemos que a justiça social se obtém doutro modo.
A primeira opinião é de que se estraga imenso dinheiro com políticos, com gente inútil, que anda aí a gastar à grande e faz disso uma ostentação insuportável. A segunda opinião é de que se estraga imenso dinheiro com os pobres, com gente igualmente inútil, que não quer trabalhar, que está viciada em viver à custa do trabalho alheio, a quem são dados subsídios para tudo, até para “iguarias” a que outrora nem os ricos chegavam e que ainda assim exige cada vez mais.
Claro que também há quem diga que o dinheiro que se podia tirar aos políticos podia ser usado a favor dos pobres, mas não é a esta que me refiro. Também seria fácil mostrar que este desvelo pelos pobres é cada vez mais passageiro e calculista, quando o que se pretende é atacar o Estado. Aquelas duas opiniões servem de base à aversão que cada vez mais se espalha em relação aos políticos e à política e são utilizadas para mostrar que o Estado, sendo imensamente rico, é mau repartidor, é açambarcador e esbanjador de recursos.
Essas pessoas jogam com a relação directa daquelas duas opiniões, ora pondo-as em paralelo, ora fazendo depender uma da outra. De qualquer modo há uma influência mútua, cada uma delas reforça e é reforçada pela outra. Pobres e políticos atraem-se e repelem-se numa relação sempre difícil. As pessoas encontraram nestas duas opiniões os chavões a aplicar na maioria das situações de mal desempenho do Estado. Traduzem a sua condenação de um certo despesismo em que existe um toque de imoralidade, de injustiça, não em relação aos pobres, mas aos que trabalham, aos que estão na actividade produtiva.
É a sensibilidade de cada interlocutor que muitas vezes vai determinar a opinião que se transmite. As pessoas arremessam a opinião mais adequada a quem já não encontra motivo para ter “pena dos pobres” ou que sente vontade de “descascar directamente nos políticos”. Aos pobres diz-se que toda a culpa é dos políticos, do seu exagerado número, do seu excessivo rendimento. Aos ricos diz-se que a fonte de todos os males está na falta de exigência, na flacidez da disciplina, na promoção da preguiça, na exaltação do desleixo.
Já em relação aos remediados, tipo classe média, avalia-se primeiro a sua sensibilidade. Se são sensíveis à pobreza coloca-se o político na lama, caso contrário coloca-se os pobres na origem de todos os males. Se já perdeu toda a sensibilidade escolhe-se a perspectiva mais adequada ao desenrolar da própria conversa. Há sempre uma ocasião em que é fácil introduzir a crítica do dinheiro mal gasto ou do excesso de gastos nas funções políticas e nas funções sociais
Colocar um rótulo nestas ideias, apelidá-las de extremistas, dizer que são obra de pessoas ressabiadas, invejosas, é redutor e não leva a lado algum. Não com este cariz absolutista mas aplicadas a casos pontuais, ou suavizadas na sua expressão, estas ideias são utilizadas por todas as forças políticas no dia a dia da sua luta. Não as negando na prática, há que lhes encontrar o motivo, debelar as suas causas, corrigir as condições em que elas germinam, anular o seu efeito desagregador da sociedade.
A verdade é que se ouve muito político sem vergonha dizer que já deu muito ao seu partido com pouca paga, o tacho não terá estado à altura. Na sociedade pode haver funções exercidas por políticos mas são muito poucas aquelas que têm que o ser necessariamente. Muito menos pode haver duplicação de funções como se propuseram os regimes assentes em ideologias totalitárias que subdividiam as funções numa de carácter técnico e noutra de carácter político.
Felizmente que estará em desuso o pagamento a um político para dar ordens a um técnico que as vai executar. Subsistem porém um grande número de políticos em cargos desnecessários, excedentários, que ocupam hierarquias imensas com cargos sobrepostos. É naturalmente a estes desperdícios que as pessoas se referem quando criticam o dispêndio de dinheiro pelo Estado para sustentar a sua máquina e a dos diferentes partidos que nela se vão pendurando.
Com as comunicações existentes, com a literacia a um melhor nível, diminuiu a necessidade de intermediação na política pelo que um número limitado de profissionais pode gerar as bases programáticas em que se basearão as normas que alguns outros porão em execução. O povo identificaria assim melhor os responsáveis e todos os que ocupam cargos na estrutura do Estado responderiam hierarquicamente, estando aqueles políticos eleitos na cúpula.
Mas se os políticos já não têm vergonha, os “pobres” também a vão perdendo e tornam-se assim alvo fácil de crítica. O Estado gasta cada vez mais nas funções sociais, no combate à pobreza e no apoio aos mais carenciados e o efeito parece ser cada vez menor. Há quem veja aí o lado cínico da política porque entende que muitos políticos só reforçam esta função do Estado para que os mais desfavorecidos se aquietem um pouco.
Há quem pense que um sistema altamente concorrencial, quanto mais liberal ele for, mais se justifica que aqueles que tem menos oportunidades sejam apoiados pelo Estado. Outros ainda pensarão na inevitabilidade de surgirem novas partilhas do trabalho, novas tecnologias e nova organizações para responder á eficácia, à rentabilidade, enfim, à concorrência de todo o lado. E pensarão também que em todo o lado, quanto maior for a exigência para integrar sistemas de trabalho eficazes, mais pessoas sobrarão para desempenhar funções subalternas, cada vez mais mal pagas, cada vez mais carentes de apoio social.
A especialização, a pouca tolerância a ritmos de trabalho exigentes, leva a que cada vez mais franjas marginais se formem e que é necessário apoiar de alguma forma. É pois de prever que a divisão dos rendimentos venha a prevalecer cada vez mais sobre a divisão do trabalho como preocupação das pessoas e que infelizmente haja cada vez mais a pensar que é dinheiro perdido aquele que se destina a garantir o mínimo de dignidade a quem não tem outra forma de a conseguir. Mas também todos sabemos que a justiça social se obtém doutro modo.
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