O choradinho nacional pode ser abominável mas é sem dúvida um desporto rentável. Não é que não haja pessoas que tiveram ou tenham razões de queixa da sua sina. Infelizmente haverá muitas com razão para lamentar a sua má sorte e que até o não fazem. Mas mais ainda são as que choram e não têm razão nenhuma.
O choradinho encarna a injustiça. Há muitos a quem as razões não faltariam para se agarrarem a ele, mas são incapazes, têm vergonha de o fazer. Os que já perderam esta vergonha, esses retocam o seu caso com as cores que mais lhes agradam ou criam mesmo um fenómeno colectivo que só eles vêm. Assim há choradinhos para todos os gostos.
Muitos escrevinhadores, opinadores, mais da Internet, mas ainda da imprensa clássica, empregam este método, generalizam casos particulares. Com teses para justificar e com medo de terem pouca razão, não suficiente para desnivelar no seu sentido os pratos da balança política, pintam excessivamente de negro o panorama social.
Há quem veja sempre a pobreza a crescer, as condições sócio-económicas a diminuírem, a descriminação social a aumentar. Os progressos genericamente conseguidos não chegam para que eles transmitam uma réstia de esperança. Mas acima de tudo está-se a ir contra a natureza das coisas ao não se reconhecer que o social está dependente do económico, ao não distinguir o individual do colectivo.
Não se pode deixar de lamentar que a diferenciação social seja cada vez maior, todos os justos o reconhecerão. Mas o progresso não é linear, há altos e baixos. Equilíbrios destroem-se, novos equilíbrios constroem-se, incessantemente, num sistema de economia aberta em que há poderosos factores incontroláveis.
As coisas não são cor-de-rosa, mas também devemos estar conscientes de que nunca o serão. Contentemo-nos em dar mais vida ao rosa, denunciando e combatendo a excessiva diferenciação, as novas formas de marginalização social, o excesso de gasto de energia, de consumo de bens escassos, a depreciação do ambiente, a obsessiva procura do bem-estar, do lazer, do prazer, da perversão.
Identificar os perigos não é necessariamente ser catastrófico. A rotura do equilíbrio ambiental, o fim dos recursos disponíveis, o prazer no sofrimento alheio, o fim de todos os valores de humanidade, de certo que, sendo uma responsabilidade global, o primeiro de todos que a deve assumir é cada um de nós, sem entrarmos em pânico nem promovendo movimentos colectivos desta natureza.
Da parte dos políticos há uma grande contribuição para o agudizar destas situações porque não fazem promessas legítimas, fecham os olhos à justiça, não incentivam o altruísmo, não promovem a colaboração. Serão mesmo os culpados, mas só enquanto membros e expoentes de um sistema que assim funciona com a colaboração de tantas pessoas e tantos opinadores.
Se não se pode deixar que os políticos adormeçam, se são os políticos que estão no poder os únicos que apetece castigar porque também são os únicos que podem sofrer de imediato as consequências da contestação, não podemos esquecer que o mal começa na falsidade em que todas as campanhas eleitorais assentam, o que compromete todos os partidos.
A pior maneira, a mais desacreditada e menos sensata, mas a mais fácil e mais disponível porque está na ponta da língua, é a promoção desenfreada do choradinho nacional que dum caso quer fazer uma calamidade nacional, que quer contaminar o ânimo daqueles que sabem que têm que trabalhar, lutar e contribuir para a sociedade para que esta lhes proporcione os meios de uma vida digna.
O choradinho é uma tentativa de desculpabilização própria, de criação nos outros de sentimentos de culpa que produzam algum efeito paralisante. Como esta doença está tão largamente espalhada, às tantas todos somos simultaneamente inocentes porque acusamos e culpados porque somos acusados. Todos sempre temos algumas razões para nos acharmos vítimas de alguma má vontade.
Afinal tivemos quase cinquenta anos a direita no poder e aí o choradinho não tinha lugar, estava ferreamente contido pelo regime político de Salazar. A miséria via-se mas não se falava dela, os pedintes deambulavam mas não lamentavam a sua sorte, os poderosos inchavam mas procuravam não ofender.
Afinal o 25 de Abril permitiu o grito dos desfavorecidos, o desmascarar de uma situação hipócrita, a abertura de novas perspectivas de justiça. Mas parece tão mal que no salazarismo quase ninguém tenha sido capaz de verter umas lágrimas e agora haja gente de direita que promova, com manifesta injustiça, o verter de tantas falsas lágrimas a querer dar a ideia de uma pranto geral.
Não podemos permitir que uma nítida hipocrisia seja substituída por outra, agora com possibilidades de abrirmos bem os olhos e ver a realidade sem disfarces e fantasias. O saco lacrimal, se estava cheio, deve ser esvaziado doutro modo. Nada mais prejudicial para quem tem razão que esta nuvem criada por quem tem intuitos mal definidos.
O choradinho encarna a injustiça. Há muitos a quem as razões não faltariam para se agarrarem a ele, mas são incapazes, têm vergonha de o fazer. Os que já perderam esta vergonha, esses retocam o seu caso com as cores que mais lhes agradam ou criam mesmo um fenómeno colectivo que só eles vêm. Assim há choradinhos para todos os gostos.
Muitos escrevinhadores, opinadores, mais da Internet, mas ainda da imprensa clássica, empregam este método, generalizam casos particulares. Com teses para justificar e com medo de terem pouca razão, não suficiente para desnivelar no seu sentido os pratos da balança política, pintam excessivamente de negro o panorama social.
Há quem veja sempre a pobreza a crescer, as condições sócio-económicas a diminuírem, a descriminação social a aumentar. Os progressos genericamente conseguidos não chegam para que eles transmitam uma réstia de esperança. Mas acima de tudo está-se a ir contra a natureza das coisas ao não se reconhecer que o social está dependente do económico, ao não distinguir o individual do colectivo.
Não se pode deixar de lamentar que a diferenciação social seja cada vez maior, todos os justos o reconhecerão. Mas o progresso não é linear, há altos e baixos. Equilíbrios destroem-se, novos equilíbrios constroem-se, incessantemente, num sistema de economia aberta em que há poderosos factores incontroláveis.
As coisas não são cor-de-rosa, mas também devemos estar conscientes de que nunca o serão. Contentemo-nos em dar mais vida ao rosa, denunciando e combatendo a excessiva diferenciação, as novas formas de marginalização social, o excesso de gasto de energia, de consumo de bens escassos, a depreciação do ambiente, a obsessiva procura do bem-estar, do lazer, do prazer, da perversão.
Identificar os perigos não é necessariamente ser catastrófico. A rotura do equilíbrio ambiental, o fim dos recursos disponíveis, o prazer no sofrimento alheio, o fim de todos os valores de humanidade, de certo que, sendo uma responsabilidade global, o primeiro de todos que a deve assumir é cada um de nós, sem entrarmos em pânico nem promovendo movimentos colectivos desta natureza.
Da parte dos políticos há uma grande contribuição para o agudizar destas situações porque não fazem promessas legítimas, fecham os olhos à justiça, não incentivam o altruísmo, não promovem a colaboração. Serão mesmo os culpados, mas só enquanto membros e expoentes de um sistema que assim funciona com a colaboração de tantas pessoas e tantos opinadores.
Se não se pode deixar que os políticos adormeçam, se são os políticos que estão no poder os únicos que apetece castigar porque também são os únicos que podem sofrer de imediato as consequências da contestação, não podemos esquecer que o mal começa na falsidade em que todas as campanhas eleitorais assentam, o que compromete todos os partidos.
A pior maneira, a mais desacreditada e menos sensata, mas a mais fácil e mais disponível porque está na ponta da língua, é a promoção desenfreada do choradinho nacional que dum caso quer fazer uma calamidade nacional, que quer contaminar o ânimo daqueles que sabem que têm que trabalhar, lutar e contribuir para a sociedade para que esta lhes proporcione os meios de uma vida digna.
O choradinho é uma tentativa de desculpabilização própria, de criação nos outros de sentimentos de culpa que produzam algum efeito paralisante. Como esta doença está tão largamente espalhada, às tantas todos somos simultaneamente inocentes porque acusamos e culpados porque somos acusados. Todos sempre temos algumas razões para nos acharmos vítimas de alguma má vontade.
Afinal tivemos quase cinquenta anos a direita no poder e aí o choradinho não tinha lugar, estava ferreamente contido pelo regime político de Salazar. A miséria via-se mas não se falava dela, os pedintes deambulavam mas não lamentavam a sua sorte, os poderosos inchavam mas procuravam não ofender.
Afinal o 25 de Abril permitiu o grito dos desfavorecidos, o desmascarar de uma situação hipócrita, a abertura de novas perspectivas de justiça. Mas parece tão mal que no salazarismo quase ninguém tenha sido capaz de verter umas lágrimas e agora haja gente de direita que promova, com manifesta injustiça, o verter de tantas falsas lágrimas a querer dar a ideia de uma pranto geral.
Não podemos permitir que uma nítida hipocrisia seja substituída por outra, agora com possibilidades de abrirmos bem os olhos e ver a realidade sem disfarces e fantasias. O saco lacrimal, se estava cheio, deve ser esvaziado doutro modo. Nada mais prejudicial para quem tem razão que esta nuvem criada por quem tem intuitos mal definidos.