Cada vez é maior o número de problemas com que deparamos. Cada vez identificamos mais bloqueios no mundo que nos rodeia. Cada vez mais os nossos ideais têm dificuldade em sobreviver. Já há saudosistas que recordam com agrado quando vivíamos num canto isolado do mundo. Na verdade temos dificuldade em identificarmos o nosso papel nos vários cenários em que somos chamados a intervir. A nossa cidadania suplantou a nossa identidade.
Aqui há uns anos só um louco poria em causa a nossa pertença a um País tão velho e sedimentado como Portugal. È verdade que hoje, ainda que com uma expressão mínima, já existem para aí alguns celtas e outras denominações pouco claras, que põem em causa o País. Este espírito desagregacionista é em parte resultado daquela nossa incapacidade para abarcarmos toda a realidade, para vermos a nosso mundo como um todo.
Se alguns põem em causa o País, naturalmente muitos mais põem em causa a Comunidade Europeia. Muitos acreditam que se impérios duraram e caíram ao fim de milénios, pelo que estas realidades mais vulneráveis, como Portugal e a Comunidade Europeia, terão os dias contados. A pertença a comunidades mais restritas parece ser a tábua de salvação que perdura mais tempo.
Simplesmente há uma diferença. Os impérios e em geral as forças políticas que defendem em primeiro que tudo a governabilidade e as forças económicas que contribuem para criar uma realidade uniforme têm por objectivo ir destruindo as particularidades de cada comunidade. Os Estados de que fazemos parte defendem que as diferenças devem ser mantidas, mesmo reforçadas naquilo que não seja anti-social, independentemente das dificuldades que isso possa acarretar.
Mas, se as realidades políticas existentes são favoráveis à manutenção da nossa identidade, não se vê que esta absorva tão rápido como seria desejável a nova cidadania que nos é atribuída. Independentemente de lutarmos ou não por essa cidadania, era importante que considerássemos a sua importância no mundo actual e a sua perdurabilidade dentro de limites temporais razoáveis. Mas a cidadania só é definitiva se é aceite de pleno pela nossa identidade.
Acima de tudo não é pela insatisfação em relação a algum aspecto particular ou temporário que vamos pôr em causa o que satisfez as gerações anteriores e tanto custou a criar. Ainda por cima nunca chegaremos a saber qual seria a realidade se ela não fosse o que é, se a opção pela integração europeia não tivesse sido tomada e os passos subsequentes não tivessem sido dados. Se já está a pôr em causa a nossa adesão pode ficar por aqui.
Digo isto porque os que apoiam a adesão também têm direito a ter dúvidas, embora saibam que elas não põem em causa as certezas adquiridas. Olham para a Comunidade como o seu segundo Estado, como lhes dando a segunda cidadania. Mas a verdade é que nenhuma relação é saudável se não soubermos como a outra parte nos olha, precisamos de saber como este Estado olha para nós.
Qualquer aversão a esta ideia de sermos cidadãos europeus pode ter resultado de a Comunidade nos ver por um prisma a que não estávamos habituados. Mas talvez a nossa identidade comportasse elementos puramente ficcionais, sem base histórica plausível. A ideia de sermos uns samaritanos, altruístas sempre prontos a ajudar o parceiro, que, embora gostássemos do poder pelo poder, nunca o exercemos de forma a prejudicar ninguém é falsa. Como o é a ideia de que com a nossa adesão passamos a ser uns devassos.
A Comunidade vê quase tudo em termos económicos, não consegue passar outra imagem. E assim sendo até nos parece que nos vê como uns pedintes que, quando temos os recursos que nos dispensam e a que não estávamos habituados, logo pensamos em os gastar alegremente. Até aceitamos ser veneradores quando nos convém, mas somos ingratos quase sempre, e julgamo-nos merecedores de um certificado final de bons alunos.
Podemos ter que rever a nossa identidade. Que deixar de defender valores que na prática não são considerados e que foram em tempo utilizados para nos limitar excessivamente as nossas possibilidades de acção. Eles desaparecerão com as gerações futuras, mas passamos por fazer o papel de trouxas se nos mostrarmos agarrados exageradamente a eles.
Podemos ter que fazer uma concessão à realidade e mudar a forma como vemos as nossas relações com os outros. Em vez de relações de poder que as pessoas exploram em seu favor, ou a que se submetem tentando minimizar os prejuízos, as novas relações tem a primazia do económico, fazem-se entre pessoas livres de aceitar ou não as condições em que desejam trabalhar, negociar, viver.
São relações menos protegidas, menos providas de sentimentos, em que não há outra defesa além da difícil e escorregadia lei. Mas são relações que não implicam dependência, submissão, humilhação. Não se prolongam para além do seu objectivo próprio, salvo vontade em contrário dos intervenientes.
Aqui há uns anos só um louco poria em causa a nossa pertença a um País tão velho e sedimentado como Portugal. È verdade que hoje, ainda que com uma expressão mínima, já existem para aí alguns celtas e outras denominações pouco claras, que põem em causa o País. Este espírito desagregacionista é em parte resultado daquela nossa incapacidade para abarcarmos toda a realidade, para vermos a nosso mundo como um todo.
Se alguns põem em causa o País, naturalmente muitos mais põem em causa a Comunidade Europeia. Muitos acreditam que se impérios duraram e caíram ao fim de milénios, pelo que estas realidades mais vulneráveis, como Portugal e a Comunidade Europeia, terão os dias contados. A pertença a comunidades mais restritas parece ser a tábua de salvação que perdura mais tempo.
Simplesmente há uma diferença. Os impérios e em geral as forças políticas que defendem em primeiro que tudo a governabilidade e as forças económicas que contribuem para criar uma realidade uniforme têm por objectivo ir destruindo as particularidades de cada comunidade. Os Estados de que fazemos parte defendem que as diferenças devem ser mantidas, mesmo reforçadas naquilo que não seja anti-social, independentemente das dificuldades que isso possa acarretar.
Mas, se as realidades políticas existentes são favoráveis à manutenção da nossa identidade, não se vê que esta absorva tão rápido como seria desejável a nova cidadania que nos é atribuída. Independentemente de lutarmos ou não por essa cidadania, era importante que considerássemos a sua importância no mundo actual e a sua perdurabilidade dentro de limites temporais razoáveis. Mas a cidadania só é definitiva se é aceite de pleno pela nossa identidade.
Acima de tudo não é pela insatisfação em relação a algum aspecto particular ou temporário que vamos pôr em causa o que satisfez as gerações anteriores e tanto custou a criar. Ainda por cima nunca chegaremos a saber qual seria a realidade se ela não fosse o que é, se a opção pela integração europeia não tivesse sido tomada e os passos subsequentes não tivessem sido dados. Se já está a pôr em causa a nossa adesão pode ficar por aqui.
Digo isto porque os que apoiam a adesão também têm direito a ter dúvidas, embora saibam que elas não põem em causa as certezas adquiridas. Olham para a Comunidade como o seu segundo Estado, como lhes dando a segunda cidadania. Mas a verdade é que nenhuma relação é saudável se não soubermos como a outra parte nos olha, precisamos de saber como este Estado olha para nós.
Qualquer aversão a esta ideia de sermos cidadãos europeus pode ter resultado de a Comunidade nos ver por um prisma a que não estávamos habituados. Mas talvez a nossa identidade comportasse elementos puramente ficcionais, sem base histórica plausível. A ideia de sermos uns samaritanos, altruístas sempre prontos a ajudar o parceiro, que, embora gostássemos do poder pelo poder, nunca o exercemos de forma a prejudicar ninguém é falsa. Como o é a ideia de que com a nossa adesão passamos a ser uns devassos.
A Comunidade vê quase tudo em termos económicos, não consegue passar outra imagem. E assim sendo até nos parece que nos vê como uns pedintes que, quando temos os recursos que nos dispensam e a que não estávamos habituados, logo pensamos em os gastar alegremente. Até aceitamos ser veneradores quando nos convém, mas somos ingratos quase sempre, e julgamo-nos merecedores de um certificado final de bons alunos.
Podemos ter que rever a nossa identidade. Que deixar de defender valores que na prática não são considerados e que foram em tempo utilizados para nos limitar excessivamente as nossas possibilidades de acção. Eles desaparecerão com as gerações futuras, mas passamos por fazer o papel de trouxas se nos mostrarmos agarrados exageradamente a eles.
Podemos ter que fazer uma concessão à realidade e mudar a forma como vemos as nossas relações com os outros. Em vez de relações de poder que as pessoas exploram em seu favor, ou a que se submetem tentando minimizar os prejuízos, as novas relações tem a primazia do económico, fazem-se entre pessoas livres de aceitar ou não as condições em que desejam trabalhar, negociar, viver.
São relações menos protegidas, menos providas de sentimentos, em que não há outra defesa além da difícil e escorregadia lei. Mas são relações que não implicam dependência, submissão, humilhação. Não se prolongam para além do seu objectivo próprio, salvo vontade em contrário dos intervenientes.
Assim também as relações entre Estados não dependem de um poderio assumido, de uma prevalência, de um ascendente, mas são mais voláteis, mais determinadas pelas vantagens obtidas caso a caso, pela conveniência de momento, sempre assentes numa defesa comum de princípios e de benefícios a longo prazo.