sexta-feira, 23 de novembro de 2007

Aos jovens restará descobrir o seu caminho?

Hoje em dia os pais, na sua ânsia de querer o melhor para os seus filhos, investem muito no seu ensino. No geral preocupam-se em definir carreiras, amaciar-lhes o caminho, preparar-lhes o futuro. É certo que entregam à escola o essencial da sua preparação mas a gosto ou contra gosto despendem uns cobres para mais algum acrescento nas matérias mais difíceis.
A família, como primeira instituição a transmitir o saber e como base estruturante da sociedade e da constituição de toda a autoridade, nem sempre consegue manter esse papel durante muito tempo. Perde muitas vezes bastante cedo uma sua parte substancial, umas vezes reduzindo-se no tamanho, às vezes e dramaticamente, deixando que ela perca a centralidade.
Contraditoriamente os jovens estão economicamente dependentes da família durante cada vez mais tempo. A sociedade apela aos jovens para que eles prolonguem a sua vida estudantil com promessas de melhor situação futura, o que, aliás, está longe de poder vir a ser cumprido no sentido do estatuto doutoral com que muitos se arrogam.
Sentir, estar atento e receptivo a esse apelo da sociedade para estudar até mais tarde é por princípio saudável, sem que o oposto seja necessariamente reprovável. A formação pode ser conseguida durante a vida. A família, pela sua parte, é chamada a cumprir o objectivo de cada vez “deixar” o jovem melhor posicionado no ranking do emprego e da sociedade no fim do seu longo período de aprendizagem.
A dependência económica prolonga-se muito para além do que ainda vão uns anos se entendia como razoável. Esta situação prolongada nem sempre é fácil de gerir porque os interesses dos dois lados vão divergindo. A uns a situação de dependência pode vir a repugnar. Outros acham-se demasiado condicionados por ela. Outros ainda não assumem plenamente as suas responsabilidades, criando à família situações difíceis de solucionar.
Se a sociedade apela, também seria natural um apelo em sentido inverso, mas no geral ela não está preparada para oferecer condições aos jovens para prosseguir os seus dois objectivos: Estudar e ser economicamente independente a partir de uma idade em que os jovens já estão na posse de todas as suas faculdades e da capacidade de definir o seu destino.
Malgrado a sua falta de sustentação económica, os jovens defendem direitos que ainda há pouco eram entendidos como naturais para a sua idade e que agora são nesta situação mais dificilmente praticados. Naturalmente que querem continuar a obter os mesmos direitos de todos os jovens a partir da mesma altura, mesmo na situação de dependência que existe e então não existia.
As situações de conflito no interior da família são potenciadas por outros aspectos com origem tanto em si como no seu exterior. A complexidade do ensino leva a que no geral a família esteja cada vez mais distanciada do dia a dia dos filhos. A falta de tempo dos pais também vai contribuindo para esse desacompanhamento. As separações e as famílias mono parentais ajudam a agravar o problema.
Os centros de interesse dos jovens são cada vez mais diversificados e cada vez menos decorrentes das referências a que os pais estavam habituados. A perca da centralidade nas famílias, como principal centro de interesses, é o mais dramático dos episódios que ocorrem, mercê dos seus novos envolvimentos.
Os jovens encontram novas referências não totalmente compatíveis com os valores prevalecentes na sociedade na altura que os pais passaram a adultos e que querem fazer perdurar. Novos valores que entretanto despontaram chegam com mais facilidade aos jovens e são no geral mais apreciados por eles.
Entre eles há hoje valores claramente negativos, canalizados por referências claramente destrutivas em relação à sociedade heterogénea em que nos movemos. Também há porém novos valores que a sociedade assimilará com maior ou menor facilidade, sem perder o fundamental dos seus princípios estruturantes.
São processos dolorosos os que então na génese duma síntese construtiva do passado com o presente, de modo a garantir o futuro. Os jovens acabarão por conseguir, obtidos os conhecimentos e a experiência sempre necessários para a elaboração do saber transmissível, fazer a súmula daquilo que eles acharão deverem deixar em herança às gerações seguintes.
Se analisarmos aquilo que os jovens estão a receber da geração anterior chegaremos facilmente à conclusão que esta ainda não conseguiu realizar convenientemente o seu trabalho. Delegaram-no numa intelectualidade fútil, avessa às responsabilidades próprias, mas manifestamente interesseira, que tudo faz para passar referências nitidamente ilusórias, por terem aspectos de maior negação dos outros do que os de afirmação própria.
Uma conjugação de factores favoráveis fez com que os criadores dessa geração que corre para ser passado conseguissem introduzir as suas próprias referências no mercado dos bens intelectuais transaccionáveis, sem que as tivessem elaborado de modo a constituírem eles próprios o suplantar das contradições vindas do seu passado.
Os jovens dificilmente entendem uns pais mais contestatários que eles próprios, não encontram grande valor em quem se limita a dizer em simultâneo mal dum passado de que nunca se encontraram os responsáveis e dum presente de que dizem não os comprometer. A culpa anda sempre solteira.
A herança recebida pelos jovens de hoje não deixa de ser uma miscelânea desgarrada de conceitos, direitos e reivindicações. Não podemos querer que os jovens bebam nela aquilo que lá não está inscrito. Se os intelectuais de hoje olham para o futuro com os olhos conturbados de quem ainda não conseguiu dar algum limpidez à sua mente, resta aos jovens descobrir o seu caminho.