sexta-feira, 27 de maio de 2011

Calem–se as vozes que morreu um Poeta

Recordo dele o seu riso estridente, o seu sarcasmo penetrante que não feria, antes estremecia com a consciência de quem o ouvia. Não visava agredir, humilhar ou sequer apoquentar quem era o alvo da sua fina ironia. Com a idade e a progressão académica, em que sempre se empenhou, foi burilando essa sua característica que era um hino à vida e que foi sacrificando a uma imagem menos controversa, quiçá mais rica.
O Luís Dantas encarnava de modo quase perfeito a figura do ser solidário, do poeta desinteressado de bens materiais, mas que tinha com a vida uma cumplicidade própria, inimitável e pouco acessível a quem não tenha acompanhado o seu percurso de vida. O seu riso não visava repelir, antes era seu intuito atrair, chamar ao convívio, integrar.
Elevou-se a pulso, sem deixar de viver os aspectos da vida que mais agradam ao ser homem e porque não ao ser homem português. Sem esquecer a irreverência da sua juventude, fazendo-a conviver no seu espírito com a maior ponderação da sua fase mais madura, que aliás cedo começou, o Luís Dantas manteve-se fiel aos traços mais vincados da sua personalidade moldados por um começo difícil e que ele venceu com o seu imenso valor.
Aproveitou os horizontes que essa Lisboa, outrora longínqua, proporciona a quem a quiser descobrir e explorar naquilo que ela tem de mais encantador. Viveu intensamente no meio no qual melhor se integrava, pese embora nas suas curtas arremetidas à Ponte de Lima natal e inesquecível, encontrasse sempre forma de encontrar o enquadramento apropriado à sua vivência singular.
Terá o Luís Dantas morrido como seria seu desejo? Decerto que não quereria avançar tão rapidamente e inesperadamente, mas há algo de poético na sua morte, que remete para outras vivências de poetas para quem a tragédia nunca andou muito longe. Calem-se as vozes que morreu um Poeta.

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