Custa-me sinceramente utilizar esta palavra tão áspera e contundente, demasiado pesada no meu contexto referencial, no entanto hoje usada socialmente sem a carga de outrora. Efectivamente quando alguém era apelidado de ladrão, era acusado de roubar, a não ser verdade era uma das grandes ofensas que se podia fazer a alguém honesto. Hoje já não é assim porque os ladrões têm bons advogados e entregam a estes as questões de honra.
Se mesmo assim uso a palavra roubar é porque pretendo remeter para os assuntos de extrema gravidade casos como os que me suscitaram esta referência. É ou não um roubo levar para casa uns milhões de bónus por cumprir determinadas metas empresariais? É ou não um roubo levar para casa reformas de centenas de milhares e indemnizações de milhões após curtos períodos de prestação de trabalho?
A expressão “roubar é a quem o tem” também está desgastada pelo seu uso tão vulgar pelo que se tornou socialmente inócua. Ela queria dizer que roubar a quem pouco tem pode causar um mal irreparável e seria mais condenável, roubar a quem o tem seria mais tolerável, e no extremo roubar a quem tem muito seria socialmente irrelevante. Claro que hoje as coisas estão invertidas porque quem tem pouco ou mesmo alguma coisa não tem o suficiente para recorrer à justiça, à “boa” justiça.
A expressão “roubar é a quem o tem” pretenderia desculpabilizar quem roubasse a quem muito tem e nesta asserção continua a fazer algum sentido, à revelia do que está socialmente aceite. Assim pensam aqueles gestores que levam maquias imensas para casa a pretexto de cláusulas abusivas dos seus contratos de trabalho. Só estão a retirar um pouco aos accionistas, na maioria capitalistas, de que a parte que detém de uma empresa só constitui uma parcela da sua fortuna.
Esquecemo-nos que há uns pequenos accionistas lesados por tabela, mas essencialmente esquecemo-nos que os clientes à força de empresas que exercem a sua actividade a nível de monopólio ou oligopólio são os mais prejudicados. Não faltará quem contraponha argumentos a todos os argumentos expendidos, como se tais valores de bónus ou outras recompensas representasse, se revertido, um diminuto desconto na facturação total da empresa.
Nenhuma das explicações dadas é convincente, a verdade é que se fica sem saber quem é mais prejudicado, se grandes accionistas, pequenos accionistas ou clientes em geral. Para a economia em geral dizem que estas situações contribuem para um clima competitivo que é benéfico. Também há quem diga que a economia paralela é benéfica e até há quem pense que a corrupção é uma forma de redistribuição meritória. O que parece evidente é que, como estas, também aquela realidade que nos ocupa contribui para o desregulamento social.
Não seria necessário que lhe chamássemos roubo para que o fenómeno não fosse grave e revelador do incentivo que a economia faz, o dinheiro, aos piores sentimentos humanos. O desgaste da palavra, a eliminação de antigas conexões quando os patrimónios eram finitos e havia honra da parte dos dois lados que celebravam um contrato, não incluindo nele cláusulas leoninas, só podem ser suprimidos colocando nessa palavra mais veemência e mais convicção.
Porém nós também dizemos ser um roubo aquilo que certos futebolistas ganham e eles nada se chateiam com isso. Também os gestores já se não chateiam porque se atribuem artes de malabaristas do dinheiro, que conseguem a sua reprodução com dribles de toda a ordem. O que é apanhado no meio desse turbilhão financeiro, trabalho, bens, serviços, clientes, são puros instrumentos para a obtenção do bem supremo, o dinheiro
E nós, os que acedemos ao vil metal com dificuldade, temos de estar calados? Não temos, mas de nada nos vale falar. Chamar roubo não tem qualquer efeito porque para o sistema judicial não o é. Manifestar a nossa indignação também não produz qualquer efeito porque o sistema político não a leva a sério. Teremos nós que nos conformar com o tentarmos causar algum dano nessas pessoas projectando sobre eles aquela terrível arma que é a inveja? Ou até esta também já terá perdido as suas qualidades?
Outrora dizia-se que certas pessoas tolhiam, em particular com o olhar. Então as virtualidades da inveja ter-se-ão perdido? Como eu nunca as possuí não posso dizer nada. Diziam outrora que esse não era um mal de que o próprio fosse culpado, se os seus olhares tolhiam, faziam-no sem deliberação prévia. De qualquer modo, além de manifestar a minha indignação, faço um apelo a quem tenha esse poder, que o exerça para bem de todos.
A não ser que esse poder só se possa exercer pelo olhar directo a essa gente. Então nada feito porque essa gente não nos passa debaixo d’olho amiúdo. Tal gente está demasiado longe de nós para que o nosso olhar as fulmine. Porém mais grave ainda é que esses que deste desbrago beneficiam são aqueles que nos querem impingir o malfadado liberalismo, a fonte de todos estes males.
Para fechar, atingido o cúmulo da responsabilidade, temos instituições que, para o bem e para o mal, eram os alicerces morais que sustentaram um limite razoável à voracidade no negros anos do salazarismo, que hoje se demitiram de uma intervenção mais global a nível de toda a estrutura social e se limitam a pretenderem aumentar o dizimo para 20 %.
Além da hipocrisia que se manifesta na autorização dada a muitas dessas pessoas, expoentes do capitalismo mais desenfreado, para falarem como exemplos das virtudes mais louváveis, há uma tentativa de branqueamento dos mais condenáveis instintos, outrora chamados de “pecados”. Sem autoridades morais, são as velhas armas o recurso possível.
Se mesmo assim uso a palavra roubar é porque pretendo remeter para os assuntos de extrema gravidade casos como os que me suscitaram esta referência. É ou não um roubo levar para casa uns milhões de bónus por cumprir determinadas metas empresariais? É ou não um roubo levar para casa reformas de centenas de milhares e indemnizações de milhões após curtos períodos de prestação de trabalho?
A expressão “roubar é a quem o tem” também está desgastada pelo seu uso tão vulgar pelo que se tornou socialmente inócua. Ela queria dizer que roubar a quem pouco tem pode causar um mal irreparável e seria mais condenável, roubar a quem o tem seria mais tolerável, e no extremo roubar a quem tem muito seria socialmente irrelevante. Claro que hoje as coisas estão invertidas porque quem tem pouco ou mesmo alguma coisa não tem o suficiente para recorrer à justiça, à “boa” justiça.
A expressão “roubar é a quem o tem” pretenderia desculpabilizar quem roubasse a quem muito tem e nesta asserção continua a fazer algum sentido, à revelia do que está socialmente aceite. Assim pensam aqueles gestores que levam maquias imensas para casa a pretexto de cláusulas abusivas dos seus contratos de trabalho. Só estão a retirar um pouco aos accionistas, na maioria capitalistas, de que a parte que detém de uma empresa só constitui uma parcela da sua fortuna.
Esquecemo-nos que há uns pequenos accionistas lesados por tabela, mas essencialmente esquecemo-nos que os clientes à força de empresas que exercem a sua actividade a nível de monopólio ou oligopólio são os mais prejudicados. Não faltará quem contraponha argumentos a todos os argumentos expendidos, como se tais valores de bónus ou outras recompensas representasse, se revertido, um diminuto desconto na facturação total da empresa.
Nenhuma das explicações dadas é convincente, a verdade é que se fica sem saber quem é mais prejudicado, se grandes accionistas, pequenos accionistas ou clientes em geral. Para a economia em geral dizem que estas situações contribuem para um clima competitivo que é benéfico. Também há quem diga que a economia paralela é benéfica e até há quem pense que a corrupção é uma forma de redistribuição meritória. O que parece evidente é que, como estas, também aquela realidade que nos ocupa contribui para o desregulamento social.
Não seria necessário que lhe chamássemos roubo para que o fenómeno não fosse grave e revelador do incentivo que a economia faz, o dinheiro, aos piores sentimentos humanos. O desgaste da palavra, a eliminação de antigas conexões quando os patrimónios eram finitos e havia honra da parte dos dois lados que celebravam um contrato, não incluindo nele cláusulas leoninas, só podem ser suprimidos colocando nessa palavra mais veemência e mais convicção.
Porém nós também dizemos ser um roubo aquilo que certos futebolistas ganham e eles nada se chateiam com isso. Também os gestores já se não chateiam porque se atribuem artes de malabaristas do dinheiro, que conseguem a sua reprodução com dribles de toda a ordem. O que é apanhado no meio desse turbilhão financeiro, trabalho, bens, serviços, clientes, são puros instrumentos para a obtenção do bem supremo, o dinheiro
E nós, os que acedemos ao vil metal com dificuldade, temos de estar calados? Não temos, mas de nada nos vale falar. Chamar roubo não tem qualquer efeito porque para o sistema judicial não o é. Manifestar a nossa indignação também não produz qualquer efeito porque o sistema político não a leva a sério. Teremos nós que nos conformar com o tentarmos causar algum dano nessas pessoas projectando sobre eles aquela terrível arma que é a inveja? Ou até esta também já terá perdido as suas qualidades?
Outrora dizia-se que certas pessoas tolhiam, em particular com o olhar. Então as virtualidades da inveja ter-se-ão perdido? Como eu nunca as possuí não posso dizer nada. Diziam outrora que esse não era um mal de que o próprio fosse culpado, se os seus olhares tolhiam, faziam-no sem deliberação prévia. De qualquer modo, além de manifestar a minha indignação, faço um apelo a quem tenha esse poder, que o exerça para bem de todos.
A não ser que esse poder só se possa exercer pelo olhar directo a essa gente. Então nada feito porque essa gente não nos passa debaixo d’olho amiúdo. Tal gente está demasiado longe de nós para que o nosso olhar as fulmine. Porém mais grave ainda é que esses que deste desbrago beneficiam são aqueles que nos querem impingir o malfadado liberalismo, a fonte de todos estes males.
Para fechar, atingido o cúmulo da responsabilidade, temos instituições que, para o bem e para o mal, eram os alicerces morais que sustentaram um limite razoável à voracidade no negros anos do salazarismo, que hoje se demitiram de uma intervenção mais global a nível de toda a estrutura social e se limitam a pretenderem aumentar o dizimo para 20 %.
Além da hipocrisia que se manifesta na autorização dada a muitas dessas pessoas, expoentes do capitalismo mais desenfreado, para falarem como exemplos das virtudes mais louváveis, há uma tentativa de branqueamento dos mais condenáveis instintos, outrora chamados de “pecados”. Sem autoridades morais, são as velhas armas o recurso possível.