sexta-feira, 7 de dezembro de 2007

O que fazer pela democracia política?

A noção mais simples de politica baseia-se na necessidade de haver Estado, estrutura não imutável, e de haver pessoas preparadas para desempenhar os cargos políticos que tal estrutura comporta. Não há exemplo de sociedades organizadas que tenham podido prescindir do Estado, nem está na natureza humana que isso seja possível num futuro previsível.
O Estado, podendo sempre assumir formas variadas, constitui o esqueleto da sociedade, sobrevive dependente da sua economia, tem uma intervenção cada vez maior na definição da sua dieta. Mas a sociedade pode não estar de acordo com a forma do Estado. Pode ter acontecido esta ter-lhe sido imposta ou já não corresponder às suas necessidades. Porém não pode prescindir dele, sob pena de por em causa a sua própria existência.
O papel do Estado pode estar inflacionado, ser caro e pode ir para além das possibilidades da sociedade. O inverso pode acontecer por descuido dos responsáveis ou falta de vontade da sociedade em contribuir para isso. Os seus vários modelos têm dependido das condições históricas, internas e externas, das cedências, transferências e do exercício exterior da soberania.
Em principio a soberania reside na sociedade e o poder de a exercer reside no Estado. Mas há situações em que o Estado, por impotência, é obrigado a partilhar poder com outras organizações da sociedade como sindicatos, grémios ou ordens. Existem forças politicas que consideram isso como uma situação transitória, enquanto não têm condições para exercer plenamente o poder.
A maioria das forças políticas entende porém não haver razões para a partilha do poder. Conseguir o entrosamento perfeito entre o Estado e a sociedade, dispensando a partilha do exercício de soberania, é antes tido por um ideal democrático que infelizmente não é decerto o objectivo nem mais nem menos imediato da maioria dos políticos. Falam mais disso quando não há dinheiro.
Efectivamente é a sociedade que tem de se preocupar em saber que Estado quer. Um Estado de dimensão excessiva pode ser demasiado complexo, pondo a sociedade perplexa e desorientada quando dele necessita. Por exemplo o excesso de técnicos pode levar a que compliquem demasiado as coisas para justificarem a sua própria existência. Tem a vantagem de ser o refúgio de muito inepto. Muitas vezes a sociedade embarca voluntariamente nesse erro.
Um Estado de dimensão restrita pode não estar a executar de modo conveniente as suas funções dinamizadoras, fiscalizadoras, de segurança e outras. Algumas deficiências podem pôr em causa mesmo a sua independência perante inimigos internos e externos. Outras deixarão mesmo sem resposta algumas necessidades sentidas pela sociedade. Tem a vantagem de não gastar excessivos recursos da sociedade. É muitas vezes uma ilusão que fica cara.
Haverá sempre forças sociais apostadas em incentivar as divergências entre a sociedade e o Estado. Mas isto não seria tão fácil se o Estado fosse transparente, a sua orgânica fosse conhecida, explicada em função de objectivos, os seus custos fossem ponderados e razoáveis. A lógica das organizações contribui porém para que os órgãos do Estado se fechem, se achem auto-suficientes, descurem a necessidade da sua permanente justificação e que, pelo contrário, tudo se lhe exija.
Criando-se o Estado para corresponder aos interesses da sociedade, sendo ele sustentado por esta, é natural que a sociedade por vezes ache exagerada e nada razoável a sua independência, ache que actua em roda livre. A perplexidade da sociedade chega à identificação da exacta sede dos poderes de soberania que têm nela a sua justificação. O Estado é por vezes caprichoso e baralha a sociedade, outras vezes é manietado por organizações desta.
Há vícios do Estado que nasceram com um determinado modelo mas que outros prosseguiram ou tentaram imitar. Por exemplo há regimes que se não cansam de exigir dinheiro para a segurança, quando o gastam em ostentação. Um Estado vanglorioso pode ser mais democrático ou mais totalitário, mas decerto é um Estado inseguro, que não está certo do seu futuro. No entanto, já muitas vezes a sociedade se deixou enlear por este cântico bazofiador.
Se tem que haver Estado para que haja politica, nem sempre é linear a sua relação com ela. Há sociedades que, por sua vontade ou não, viram instalar-se um poder oligárquico que não é exercido por políticos. Para haver política tem que haver candidatos sem origem pré-definida e eleições para todos os órgãos que exercem os seus poderes mais significativos. A política não pode ser exercida por um grupo fechado que usurpa para si os direitos de todos.
Os estados totalitários e autocráticos tendem a reduzir ao mínimo a politica, o debate, a discussão, a eleição. Os membros dos órgãos de soberania são-no por pretenso direito próprio ou cooptados por estes. Ainda por cima no geral só informam a sociedade sobre aquilo que acham fundamental para assegurar a sua manutenção no exercício dos seus exacerbados poderes. Se querem passar-se por políticos, são políticos desprezíveis
Num Estado democrático não cabe o exercício arbitrário do poder mas nele existem bons e maus políticos. A democracia e os próprios políticos só têm a ganhar em serem bons comunicadores, em cultivarem uma imagem de qualidade e rigor, em não serem pau para toda a obra e em se não agarrarem a qualquer preço ao poder. Um político tem que o ser por gosto, sem ceder a facilitismos.
Um político não pode cultivar uma imagem fácil, mas se perdeu o seu controle, se ela se desgastou com o tempo, só tem que deixar as rédeas do poder. Os ditos ícones, mártires e outros insubstituíveis que aproveitam todas as suas influências para se perpectuarem são um preço exagerado da democracia.