sexta-feira, 2 de dezembro de 2005

A mesma conversa de sempre

O plano e o orçamento apresentados pela Câmara Municipal de Ponte de Lima à apreciação da respectiva Assembleia Municipal contem considerações de natureza política perfeitamente dispensáveis na medida em que, uma vez aprovado, se pressupõem que a sua execução deve ser empenho de todos.
Quanto à sua substância é claro que o seu autor se remete a banalidades que nada contribuem para a eficácia do tal empenho que todos deveríamos emprestar à luta pela melhoria das condições em que a população de Ponte de Lima vive, e que, sem dúvida, melhores condições merecia.
Acções materiais nós queríamos. Acções imateriais são de natureza tal que corremos o risco que o vento as leve, sem trazerem a satisfação daquilo que todos esperam e é imperioso que se faça. E não venham com histórias gastas de que a oposição teria a obrigação de apresentar propostas alternativas.
Conhecendo nós, como conhecemos, com quem falamos, sabemos que por mais fundamentada que sejam as propostas apresentadas, como foi o caso da proposta de alteração da taxa do Imposto Municipal sobre Imóveis, não vindo elas das bandas do poder não são aceites, o poder tem medo de perder protagonismo.
E, aliás, todas as propostas para um leque tão grande de questões precisam, além de dados técnicos que não possuímos, de um enquadramento, de partirem de uma análise apropriada da situação global do Concelho, do País, da Comunidade Europeia e do Mundo.
Qual o breve quadro que se pode fazer da situação social e económica deste Concelho? Como se perspectiva um pouco do caminho a percorrer no futuro, quais os objectivos a atingir?
A população de Ponte de Lima sofreu, com a emigração para França nos anos sessenta e setenta, um forte abalo na sua estrutura rígida e ancestral. As transformações que se vêm operando por via da nossa integração na C.E., da abertura do nosso mercado, da liberdade quase ilimitada de comércio, levaram a que a população rural quase se extinguisse como tal.
Estamos perante um novo cenário. A agricultura tornou-se um part-time, uma ocupação de fim-de-semana. O que resta vai continuar a definhar, à medida que emagrecerem os Fundos Comunitários.
As pessoas procuram satisfazer de outro modo as velhas e as novas necessidades. Vai-se trabalhar para Espanha, para os concelhos vizinhos, mas em Ponte de Lima poucos trabalham. Já não há lavradores, já não há serradores, já não há sapateiros, das velhas profissões já quase nada resta.
Os Limianos querem contribuir para o enriquecimento e sucesso da sua terra. Deixam fora do concelho obra feita. Regressam a Ponte de Lima para gastar, mas preferencialmente em bens não duradoiros e compram preferencialmente a comerciantes que são também de fora do concelho.
O que produz quem teima em cá trabalhar e estar? O vinho branco já ninguém o bebe. O vinho tinto é comercialmente de pouco valor: degrada-se depressa, não é vinha de garrafeira. Com a perda dos mercados tradicionais, a partir dos anos noventa, com a diminuição drástica da procura, o cultivo da vinha já não é rentável.
Quanto maior é a propriedade maior é o prejuízo. O preço comercial de outros produtos tradicionais da nossa agricultura também não justifica o seu cultivo nesta região de minifúndio e de clima instável. Só se for a feira de produtos agrícolas na Quinta de Penteeiros que venha dar um abanão a isto. E a adesão à Agrobio traga novas ideias e culturas.
A pedra é o último dos nossos recursos como produto vendável. O cuidado especial que devia haver no sentido de minimizar as agressões ao ambiente, à saúde e à qualidade de vida que este trabalho da pedra implica pura e simplesmente não existe.
Não podemos estar em estudo toda a vida, senão, como é habitual, quando tivermos a solução a galinha já pode ter alvorado. Estruturar o espaço de extracção e laboração da pedra, organizar, disciplinar, apoiar os pequenos empresários e trabalhadores é um imperativo municipal de que a Câmara custa a tomar consciência.
È preciso agarrar “à séria” no problema. Ponte de Lima não se pode permitir perder também esta fonte de rendimento. Mas tem de a conciliar com outros valores como os ambientais, de saúde, com os valores paisagísticos porque não. A nossa vista não se confina às também, há muito, tão maltratadas margens do Rio Lima.
Vamos sendo obrigados a pôr de lado valores a que muita gente estava apegada. Mas tentemos salvar aquilo que merece a pena salvar. A ruralidade só existe nas infra-estruturas e na paisagem, mas já não existe nas almas.
O folclore só está no espectáculo, mas já não existe na vida. Os números são a preferência dos residentes e dos investidores. A competição está instalada a todos os níveis. Poderosos são somente os donos do mercado.
Quem tem mercado escolhe o local de produção que lhe traz mais vantagens. Capacidade de produção já não é factor competitivo. Tudo se compra, tudo está disponível no mercado global.
Não há poder de atracção suficiente para a ocorrência de milagres. Não é olhando para o interior das nossas muralhas que encontramos solução. A solução está para além delas, no exterior delas, algures no universo.
A mediatização que ocorreu nos últimos anos e por via dos mais diversos acontecimentos nem sempre é um benefício para o Concelho. O resultado mais palpável é o massacre a que somos sujeitos aos domingos quando o turista de garrafão dos tempos modernos nos cai em cima. Resultados são mais os negativos que os positivos.
Confronto duro com o Governo? Não me parece a melhor solução. Cheira a prato requentado e nada salutar.