sexta-feira, 24 de novembro de 2006

Visita ao Itinerarium III de um poeta com obra feita

A crítica literária é, em muito, feita à base de balanço de um percurso poético, mesmo que esteja em causa apenas uma obra determinada. Mas tal será, tão só, devido ao facto de a crítica ser feita normalmente por pessoas amigas e conhecedoras de toda a obra do poeta.
Não digo isto em sentido depreciativo, como é bom de ver. Além do mais não me era possível fazer igual por desconhecimento, talvez imperdoável, mas isso é outra questão.
Eu não acho recomendável, numa análise “jornalística”, utilizar métodos próprios de compêndio, em que se dá a imagem global da vida do poeta. Qualquer obra, de qualquer poeta tem que valer por si. Nem é necessário especular sobre o que está por trás de qualquer deles, obra ou poeta.
A poesia não estará facilmente à mercê dum prosaico como eu. Porém, penso eu, não a utilizando como técnica, nada me impede de ter vivências poéticas semelhantes às dos verdadeiros “fingidores”.
Se assim não fora não haveria ninguém a “comprar” poesia, se tal fora o hermetismo da sua mensagem e não houvesse partilha. Mas claro que é sempre problemático transmitir por prosa vivências previamente poetizadas.
O nosso objectivo aqui tem de ser incentivar/desincentivar qualquer leitura, sem atender a outros factores, sejam pessoais ou não, salvo os de índole qualitativa, se acaso disso formos capazes. Quem dá uma panorâmica da obra dará sempre realce aos aspectos que lhe saltaram mais à vista.
Como quem vai buscar a pedra para a construção da casa, Cláudio Lima vai buscar a palavra para a construção do verso, para com ele nos dar a razão do seu versejar.
O Autor segue a sua gestação quando o poema amadurece …/num vagar de essências …até que com a maturação se dê a explosão … numa girândola …/de sementes.
Da palavra à música é um caminho curto, qual perfeita simbiose que depura o silêncio e faz explodir as corolas/do sublime.
O ter uma folha em branco é o princípio/da queda na ardilosa teia/das palavras. Palavras que se juntam sem sentido/nem destino, só/ímpeto desarticulado, qual conspiração contra o poeta.
À espera de um só verso … no tempo sem limite, é como esperar que deus redime a espera/que luz ou que quimera? É a utopia capaz de iluminar o universo do Poeta.
Pobre poeta, que as palavras lhe montam, a cada passo, uma armadilha, porque por lúbrico deleite … imagina-se a copular metáforas … nessa ousadia, de solitário e concupiscente trato.
Com girassóis/de alegria e chaminés/verticais de assombro se faz a exaltação da poesia – chave da oclusa manhã enfim liberta.
Aqui chegado, Cláudio Lima dá-nos o seu conselho que é em ti/que pode acontecer/a definitiva noite/do poema. A neblina e a prolixidade são más conselheiras, avisa.
Como ténue guião para o leitor mais distraído chega por aqui. O Poeta mendigo continua algures, “sirvo-me dos restos/que deus desdenhou/vasculho no seu caixote” e, enfim, há-de encontrar as palavras …/de cujas/dispara uma luz clandestina às vezes.
Descrente que a poesia não seja um fingimento, o Poeta diz tudo letra e ilusão/em combinações imperfeitas/-voláteis bolas de sabão/ logo desfeitas. De certo que o Poeta também pode fingir que finge.
De alma vazia o Poeta chega ao arrependimento, que o voo sem asa e sem destino o leva ao fingido orgasmo.
Nem todo o caminho deve ser percorrido com guia, seja este bom ou mau, mesmo por quem dele possa precisar. O leitor fará as suas próprias descobertas, seja na confissão ou na revolta.
Sendo esta poesia, como no geral o é, resultante de uma visão pessoal, esta é aqui claramente assumida, com as suas vivências particulares, reais ou virtuais, mas que encontrarão eco nos sentimentos do leitor.
O último poema, que não é de menor apreço e é evidentemente pessoal, entra na linha de um certo pragmatismo mas, como recusa que é, grito de protesto partilhado por todos os poetas, tem a nossa compreensão. Que viva a poesia!

terça-feira, 21 de novembro de 2006

Há “passadeiras” que só o são na imaginação de alguns

Dúvidas tinha algumas, os amigos juntaram outras e o assunto é de tanto melindre que me custava pronunciar sobre ele. Há aquela conversa de esplanada de Largo de Camões em que todos sabemos tudo, mas dali não vem nem mal nem bem ao mundo. Quando se trata de escrever num jornal, tomar uma posição num órgão de poder há que ser preciso, senão mais vale estar quieto.
Felizmente que chegou a mim uma informação fresquinha, que me esclareceu, sem ser necessário consultar a Lei. Mas mesmo assim eu, que antes tinha medo em, consultando-a, não conseguir ver o assunto na sua perspectiva global, foi à fonte e fiquei definitivamente sem dúvidas.
Mas aquelas informações surgiram-me tão inesperadas no conteúdo que não me atrevo a escrever sobre a questão em questão, que é tão só o atravessamento das faixas de rodagem pelos peões, sem referir a autoridade do Automóvel Clube de Portugal, entidade avalizadora devidamente creditada e em que foi beber tanta “sabedoria”. Que transmito à minha maneira.
Em Ponte de Lima re(fizeram-se) recentemente algumas passadeiras de peões, fizeram-se outras coisas que o não são, mas passaram e passam por o ser e até há gente que jura a pés juntos que o são, na Rua Cândido da Cruz em frente ao n.º 22 e no seguimento da Ponte Medieval para o Largo de Camões.
Só algumas das passadeiras que se “adivinham”, isto é, virtuais, tem sinalização horizontal, no chão, e, na ausência de outra, só essas passadeiras o são efectivamente. Isto é, só essas obrigam o peão a passar por elas, se ele quer atravessar a faixa de rodagem a uma distância inferior a 50 m dela.
Além do mais não há nas passadeiras limianas semáforos nem qualquer sinalização vertical que deveria alertar os peões para o cumprimento da Lei e os condutores para a maior probabilidade das ditas passadeiras aparecerem.
Os peões se, para atravessarem a faixa de rodagem, se não dirigirem a uma passadeira que esteja a menos de 50 m podem ter de pagar uma coima de 10 a 50 € (art.º 101 nº 3 e 5 do Código de Estrada).
Salvo este aspecto os peões podem atravessar a faixa de rodagem em qualquer local, desde que cumpram o seguinte:
“Os peões podem transitar pela faixa de rodagem com prudência e por forma a não prejudicar o trânsito de veículos quando efectuam o seu atravessamento.”. Caso contrário, incorrem na coima de 10 a 50 € (art.º 99 nº. 2 alínea a) e n.º 5).
Os peões têm de ter, fora das passadeiras, precauções redobradas porque aí os condutores não têm que ter especiais cuidados. Já perante as passadeiras estes têm obrigações específicas:
“O condutor deve reduzir a velocidade e, se necessário, parar para deixar passar os peões que já tenham iniciado a travessia da faixa de rodagem.”. E “mesmo que a sinalização (mesmo luminosa) lhe permita avançar, deve deixar passar os peões que já tenham iniciado a travessia da faixa de rodagem.”.
O não cumprimento destas obrigações sujeitam o condutor ao pagamento de uma coima que pode ir de 120 a 600 € (artº. 103 nº. 1,2 e 4).
Assim o respeito pela sinalização luminosa é imperioso quando impeditivo, mas as restantes obrigações são comuns a qualquer passadeira. Pelo seu lado:
“Os peões não podem atravessar a faixa de rodagem sem previamente se certificarem de que, tendo em conta a distância que os separa dos veículos que nele transitam e a respectiva velocidade, o podem fazer sem perigo de acidente.” Caso contrário, incorrem na coima de 10 a 50 € (artº. 101 nº 1 e 5).
Vejamos: Acontece haver pessoas que seguindo por um passeio lateral à faixa de rodagem e, tendo à sua frente uma passagem de peões, invertem intempestivamente a sua direcção e atravessam-na sem curar de saber se o condutor tomou todas as cautelas para precaver essa inesperada situação. Estas pessoas estão a infringir a Lei. Não procedem correctamente.
Outra situação que tem o seu quê de caricato, não fora perigosa, é os peões que correm para chegar à passadeira mais depressa do que um carro que dela se aproxima a uma velocidade normal. Claro que não estão a proceder devidamente.
Outra situação perigosa, e que devia merecer a atenção das escolas, é a dos utilizadores de velocípedes, que neste caso são equiparados a peões, mas que dispõe de uma maior velocidade e que se atravessam nas passadeiras inopinadamente, por vezes vindos de trás de qualquer obstáculo visual, criando problemas com carros que delas também se aproximam, mas a uma velocidade normal. Claro que também estes procedem de modo incorrecto.
Voltemos às duas situações acima referidas, situações particulares que merecem ser analisadas, tão referidas e controversas que elas são.
Na impossibilidade de serem colocadas no seguimento da Ponte Medieval barras brancas longitudinais paralelas ao eixo da via porque seria contraditório com o efeito pretendido com aquelas pedras, só será possível assinalar uma passadeira naquele local com duas linhas transversais contínuas de cor branca, a colocar ao lado daquele corredor em pedra homogénea, sinalização a reforçar com um sinal vertical de cada lado da faixa de rodagem.
Para que não levem a sério aquela passadeira a brincar, enviesada e tudo, mas que é considerada efectiva por muito boa gente, será recomendável colocar no fim da Rua Cândido da Cruz uma passadeira real, para que as pessoas lá se dirijam.

sexta-feira, 17 de novembro de 2006

A grande alteração do paradigma da natalidade

A preocupação com os filhos é fenómeno recente, dizem os historiadores. Mesmo na sociedade ocidental de matriz cristã, na qual o menino Jesus era objecto de rara atenção, cuidados com os filhos quase sequer existiam na barriga da mãe.
E, se vista a criança, ela merecia alguma atenção, os cuidados terminavam quando começasse a andar. É que a mãe era peça fundamental na angariação do sustento da família e não tinha tempo para meiguices.
Mesmo nas famílias abastadas da nobreza ou burguesia os filhos eram cedo entregues a amas e criadas e as mães não tinham qualquer preocupação com a maneira como eram tratados.
A mortalidade era imensa mas os nascimentos compensavam largamente esse mortório continuado. As pestes ciclicamente davam cabo de quase metade da população. A esperança de vida era extremamente reduzida.
Mesmo assim periodicamente havia explosões demográficas que davam origem a terríveis crises de escassez de bens alimentares, fermento de guerras, de tentativas de expansão, de cruzadas, de descobrimentos, de migrações.
Só a partir da civilização industrial começou a ser dada outra importância às crianças, valorizando-as como factor económico a ter em conta, tal qual a mão-de-obra constituída pela sua família.
Começou então a pensar-se também no necessário controlo do crescimento populacional de modo a que não houvesse falta nem demasiado excesso de população, de forma a corresponder às necessidades da economia.
As guerras dos dois últimos séculos já não são necessariamente por um problema de expansão da população mas de expansão do domínio, redefinição de fronteiras e da propriedade dos recursos.
Com a paz conseguida após a segunda guerra mundial e a formação das estruturas que darão origem à Comunidade Europeia, criaram-se condições para passarem a ser consideradas e generalizadas novas preocupações com os filhos.
Com a evolução da condição feminina, o papel e a opinião da mulher vão sendo cada vez mais preponderantes na questão da natalidade e cada vez mais contrários à formação de famílias extensas.
Com o aumento da escolaridade e das exigências dos próprios jovens, o ter filhos passa a ser cada vez mais considerado como um encargo que se cria para um período significativo de vida o que normalmente é vivido com maior hedonismo.
Estes e outros factores estão a dar origem a uma situação de declínio da população. A pirâmide da população aguça na base e alarga-se no topo, tendendo para um aspecto de paralelepípedo, diminuindo a população em idade de trabalhar.
Com o aumento da esperança de vida, os encargos com o topo da pirâmide da população vão aumentar ainda mais e os governos afadigam-se em planos para vir a minimizar em tempo útil este problema.
Simultaneamente os governos vêem-se na necessidade de fazer inverter a situação da natalidade, conscientes que suprir a necessidade de trabalhadores com o recurso à imigração não resolve a situação. Também os imigrantes informam dos mesmos “defeitos” e não deixarão gerações para os substituir.
Ter filhos parece ser mesmo um embaraço e mesmo que se diga aos jovens actuais que, por este andar, não haverá, em devido tempo, ninguém para lhes pagar as reformas, eles não se dispõem a ter três ou mais filhos como antigamente.
Para os jovens o tempo e o dinheiro já têm destinos programados, muito antes de se lá chegar e de se ver a sua cor. Quer dizer que já não se caminha para o futuro com os mesmos olhos de antigamente.
A competição está agora ao virar da esquina, na pista de dança e na medida da cintura. Os filhos podem ser um empecilho que dificulta os golpes de rim. Só a diminuição da competição desenfreada pode contribuir para alargar o cinto.
A natalidade não pode ser reduzida ao nível do capricho que fica caro ter. Caro em condições económicas, mas também em condições psicológicas e sociológicas. Ninguém tem hoje sequer a garantia da partilha desses encargos.
Impõe-se uma diminuição da idade em que os jovens que querem ser “doutores”, hoje todos, adquirem a sua independência económica. Para além de se não abandonar a formação universalista, impõe-se definir mais cedo cada curriculum em função da formação final a atingir.
Impõe-se que a paternidade partilhada seja mais que uma contribuição monetária para as fraldas dos filhos. Os encargos com a criação dos filhos têm de extravasar muito as simples trocas de afectos em momentos pré-definidos.
A reversão do paradigma civilizacional não é fácil e será mesmo impossível no nosso tempo. Outras civilizações vão ter uma palavra a dizer na fixação de novos paradigmas, se continuar o actual processo de globalização.
A civilização ocidental só tem a ganhar em se não isolar numa solitária decadência. Esperemos é que as outras civilizações saibam ultrapassar as muitas contradições de que elas próprias informam.

terça-feira, 14 de novembro de 2006

O Carro é o amigo mais fiel do …………….Governo

Nesta questão das finanças públicas o mais pintado se espanta: Eles, os responsáveis pelo nosso governo, que 99,9% são sempre os mesmos (e só 0,1 % vão aprendendo alguma coisa e mudam de ideias), andaram anos após anos a dar a alguns e a prometer a muitos.
(Daqueles responsáveis, grosso modo, 49,95 % são do P.S. e outros tantos do P:S.D.. Mudam 0,05 % do P.S. e outros tantos dos restantes partidos).
Esses mesmos responsáveis (Não vou agora discutir se estão entre os 49,95% ou entre os 0,05 %) tiram agora uns trocados a alguns e sacam o que podem a muitos. Que o Governo não tem dinheiro, que os cofres estão vazios. Instalou-se uma espécie de peditório nacional. É a crise que está aí.
São os hospitais que gastam tudo em papel higiénico, é a G.N.R. nas balas, os professores nas greves, os alunos nas cervejas, todos andam em aulas para verbalizar queixumes, valha-nos isso. Estar pronto a aparecer na televisão compensa bem um mês sem salário.
Fala-se mas a sério acho que a crise não vai chegar aos detentores do poder na poderosa máquina do Estado. Fala-se em migalhas mas o grosso não é tocado. Há muito parasita que, a trabalhar ou na reforma, é um pesado encargo.
De qualquer modo há um pouco de exagero em virar toda a artilharia contra os funcionários públicos. Porque se os das linhas mais baixas são responsáveis pela fraca produtividade, de que são responsáveis os das linhas superiores?
Nunca se pode dizer que a crise chega a todos. Andam para aí uns gajos a quem sobraram uns “cobres” da anterior crise no Vale do Ave, ou outra afim, e que compram boas charretes puxadas, não por um cavalo, mas por tantos quantos cabem na Ponte Eiffel de Viana do Castelo.
Depois de aparecer alguém a decretar o fim da crise vamos estar alerta que só então se saberá se esta crise chegou efectivamente a todos. Se sobrarem umas massas a alguns figurões para comprarem uns aviões, então continuamos na mesma. Teremos sempre razão, mas quando já é tarde demais.
À maioria resta contribuir, condescender no que estamos habituados, pagar aqui e acolá, moderar os gastos nisto e naquilo, apertar o cinto e o colete também, juntar bem a roupa ao pelo, não se vá apanhar uma gripe. Se chegarmos vivos ao fim da crise já é bom.
É que a crise está de pedra e cal, não vai embora tão cedo. Nós cá fomos sentindo-a, qual tempestade que atinge todo o território nacional, mas agora veio sob a forma de furacão para esta região.
Por onde havia de vir? Claro que pela estrada mais utilizada, por onde havia de ser! Porto - Viana do Castelo vai passar a ser uma ex-Scut, que o utilizador vai ter que pagar, que nós teríamos entrado no clube dos ricos.
Nós que aceitamos o princípio do utilizador pagador, que é melhor ser este a pagar do que pagarmos todos, mesmos de forma diferida, achamos que há aqui algo de precipitado e há mesmo um senão.
Ninguém aceitaria que, por ter um vizinho com uma rica casa, teria que pagar pelo seu casebre o mesmo I.M.I. que ele. Quando se diz que o Baixo Minho é uma região rica e tem de pagar portagens nós temos de ser levados na enxurrada?
Se nós, o Alto Minho, estamos na cauda de tudo o que é indicador, se muito se deve a nós, mas muito mais aos governantes que temos tido, não se aceita um agravamento do que já é problemático.
Pagar portagens a Norte da Póvoa do Varzim é de todo intolerável. É que mesmo a parte do Baixo Minho Litoral acima da Póvoa tem os mesmos índices do Alto Minho. Há um princípio de solidariedade com Esposende que devemos assumir.
Sabe-se que aquilo que o Governo pretende é apanhar na sua rede de cobrança de contributos para a crise é o transporte internacional que foge à auto-estrada de Ponte de Lima. Mas nós não temos a culpa.
Quando se fala em arrecadar mais dinheiro, a primeira forma que surge no espírito dos governantes é tributar os veículos de transporte e tudo aquilo que tem a ver com a sua utilização. Em especial os combustíveis e as portagens.
Tornamo-nos de tal forma escravos dos veículos automóveis, dependentes da sua utilização no transporte pessoal e de mercadorias, que não prescindimos deles. O Estado agradece, o seu consumo é dos mais facilmente tributáveis, que aqui quase todos bebem do mesmo.
Um carro, um autocarro, um camião são como porcos que deles para tudo se arranja aproveitamento, isto é, um impostozinho. São o melhor mealheiro para os momentos de crise.

terça-feira, 7 de novembro de 2006

Os comentadores

A certos comentadores da coisa pública corre-lhes facilmente a pena para a sandice. A técnica é sempre a mesma, sem inovação e criatividade, começam por lançar cortinas de fumo, fazem falsas profecias, pintam o futuro de negro e lá vai a arrufada de insultos do costume.
O objectivo, não é de esclarecer ninguém, não é de deixar que as pessoas tirem conclusões por elas próprias, é sim de sentenciar, de chatear, qual a esperança de que alguém mude de direcção, só por, eventualmente, vir a ler coisas que só se entendem se se analisar o estado de espírito de quem as escreve.
Proclama-se que as pessoas estão a trabalhar para criar o inferno no futuro. Como a nível local as pessoas se conhecem e este discurso não passa tão incólume, estes comentaristas viram-se para o nacional. Ataca-se alvoroçadamente este ou outro qualquer governo, tanto faz.
Nada mais louvável que a pretensão de querer que os outros vejam aquilo que possivelmente não vêm. Mas tal não se consegue com um quadro previamente pintado, por mais qualidade que ele tenha, mas com a sua pintura perante os olhos de todos, para que eles saibam como pode ser criado ou pode ser evitado.
A premunição simples não é eficaz, já ninguém acredita em visionários. As pessoas já deixaram de se identificar por estados de alma.
O que se passa com estas perspectivas negativas a que as pessoas estão mais habituadas passa-se igualmente com as apologéticas. Também os reveladores de futuros risonhos agem de modo similar. Os seus ídolos fazem tudo de bem, cada passo seu é um passo para o seu e nosso céu.
A nível local muitas pessoas procedem assim e acreditam em amanhãs que cantam. Por exemplo aquelas que vêem jardins, bosques, pintassilgos e canários por todo o lado e turistas a aterrar em jactos resplandecentes no planalto de Antelas. Como a nível nacional há aqueles cujos ídolos residem mais longe, em Lisboa, e vêem os jactos com triliões de turistas a aterrar na Ota, claro.
Estes têm de fazer do passado um cataclismo e de criar um momento no tempo universal a partir do qual o Sol passou a resplandecer a todas as horas do dia. Se não houvera quem do presente já fizera esta maravilha em que vivemos, o futuro nunca seria tão magnífico como eles e só eles o vêm.
Ora nada disto é verdade, nem as perspectivas são tão negras nem tão brilhantes como muito querem fazer crer.
Que esta Câmara de Ponte de Lima não tem plano é bom de ver, quando se entende que deveria haver uma ideia consensual de qual a evolução futura do concelho, para que não houvesse informação privilegiada e hipóteses de corrupção.
Que este governo não é socialista é bom de ver, quando por socialista se entende como um distribuidor daquilo que há, mas que neste caso não há, porque não tem que haver ou porque atrás alguém colocou o que havia em certas mãos impróprias.
Que esta Câmara de Ponte de Lima sofre dos problemas de excesso de poder de que sofrem todas as Câmaras por esse País fora é bom de ver, quando sendo responsáveis pela concepção dos documentos de planeamento, são também pela sua execução. Não há uma Assembleia Municipal com poderes efectivos.
Que este governo permite a acumulação capitalista é bom de ver, mas qual o governo por esse mundo fora que não permite, mesmo os poucos que dizem o contrário, e que quando caem deixam ver toda a espécie de podridão que escondem.
Perante a dificuldade hoje existente em se ser justo, esperar-se-ia que não houvesse pretensos julgadores da história, mas efectivos construtores do futuro. Só uma sociedade de homens livres, sem cartilhas e sem manhas, poderá vir a construir um Estado sério, nem pendura e sem penduras.
A relatividade hoje existente em relação a valores e princípios que há uns anos se consideravam património inalienável de uma corrente política ou até, por extensão, da humanidade, é por demais evidente.
Também o novo enquadramento das pessoas é mais complexo do que há uns anos atrás, pela reformulação e crescimento das classes, pelas novos esquemas que as pessoas voluntariamente compartilham, pelas vitimações a que a comunicação dá origem, pela facilidade de fazer eco com a vaidade e com o choradinho nacionais.
Perante tanta turbulência é por demais importante falar para o homem comum, aquele que tem as qualidades e defeitos do homem de hoje, mas que tem a capacidade de ser o homem de amanhã.É necessário que se fomente nesse homem comum uma sadia sede de justiça e se evite ou anule uma insaciável sede de vingança.

domingo, 5 de novembro de 2006

Com bom vinho se fazem bons amigos

Uma frase atribuída a Salazar afirmava que “ beber vinho é dar de comer a um milhão de portugueses”. Hoje, manifestamente, que assim não é, e ainda bem, porque para proporcionar rendimentos suficientes a um milhão teríamos que beber muito vinho, o que de certo nos faria algum mal.
Mas a vinha, mãe deste precioso néctar, continua a ocupar um lugar privilegiado na paisagem rural e em alguns sítios exclusivo até. Videiras cortadas, vinhas abandonadas, crise a sério só em Ponte de Lima pelos erros cometidos.
Proponho-me fazer um louvor ao vinho, caminhando por outra via, que não esta da economia, demasiado batida e desagradável nesta altura de recessão. Esqueçamos dívidas e dúvidas quanto ao futuro e quem tão mal fez ao vinho.
O vinho tão louvado tem sido, que é difícil ser inovador. Desde tempos imemoriais, logo que se descobriram as imensas qualidades do mosto gerado pelas uvas, que ele tem sido melhorado, seleccionado e não deixou de ser apreciado.
Gregos e Romanos concederam-lhe célebres patronos, com assento no reino dos Deuses. Se para a maioria dos povos sempre foi objecto de intensas libações, para o Cristianismo ascendeu ao plano simbólico de “sangue de Cristo”.
Só os muçulmanos lhe atribuem mais defeitos que virtudes. Mas uma coisa é certa: Há culpas que se atribuem ao vinho que não lhe pertencem, como se prova por eles próprios que, para fazerem tanta asneira, não precisam de beber.
Eu, por mim, confesso, de todas as bebidas, desde a água aos simples sumos miscíveis, às miscelâneas ditas naturais, chegando às bebidas fermentadas e destiladas, a que mais aprecio depois da água é o vinho.
Não se riam: Eu tenho pela água uma veneração que assume aspectos divinais, ela que sempre foi considerada elemento entre os essenciais que compõem o universo. Eu aceito o seu carácter sagrado e bebo-a com moderação.
E, embora infelizmente aconteça, hoje o vinho já dá mais garantias de pureza que a própria água. Tanto assim que já há vinhos ecológicos, sem esses horríveis fungicidas e pesticidas, que quando muito absorvem algum herbicida, que é preciso tirar as ervas e a sachola é pesada.
A água do solo pode não ser pura, que a videira funciona como um depurador natural, de tal modo que a água quando chega à uva já vai liberta de impurezas, pura como a das nascentes de antigamente.
A uva acrescenta então a essa água assim purificada os milagrosos aromas, ácidos, taninos, não me preocupei em fazer ciência, mas acho que há mais alguns e que até só se libertam na fermentação dos seus açúcares. O que interessa é o resultado.
A grande diferença do vinho para outras bebidas, essas bem mais responsáveis pelos malefícios que se lhe atribuem, é que ele é uma bebida fermentada, resultado de uma transformação natural, com baixo grau alcoólico.
Não sou delator, mas olhem que as grandes culpadas do alcoolismo e dos seus efeitos maléficos são as bebidas destiladas, que simples ou compostas, transportam o álcool em estado puro para o organismo humano.
O álcool resultante de fermentações é diferente do que resulta de destilações. O mal é quando se faz vinho a “martelo”, pois aí usa-se este álcool, tal como na confecção das aguardentes, licores, whisky, bebidas brancas em geral.
A defesa do carácter genuíno do vinho é importante para a preservação do seu papel na nossa cultura milenar, no relacionamento humano. Tanto é verdade que nós sabemos ser muito mais fácil entendermo-nos com o leve desprendimento que ele nos proporciona.
O papel das Adegas Cooperativas deveria passar estatutariamente por aí. E em relação ao vinho verde, um vinho difícil, com grandes mudanças de quantidade e qualidade de um ano para o outro, resultado de pequenas produções, com métodos de cultura diferenciados, esse papel era, há uns anos, imprescindível.
Hoje já vão aparecendo outras formas de associação, normalmente à volta de uma razoável produtor, que dá também saída à produção de uns tantos “vizinhos”. E as Adegas correm o risco de ficar com as produções residuais, sem o prestígio que lhes permita exercer aquela função de que algumas, aliás, largaram criminosamente a mão. Infelizmente, por isso nunca ninguém foi penalizado.
O vinho verde é um vinho para beber jovem, isto é, não dá para ser envelhecido em cascos, garrafas ou qualquer outro recipiente. Além do mais, o vinho verde tem características próprias que se lhe permitem manter os apreciadores, não favorecem novas angariações.
Tendo a sua produção crescido muito, em particular a de vinho branco só a qualidade permite ambicionar novas adesões à sua bebida. Com as campanhas feitas contra o álcool, este vinho que sozinho será o menos culpado por acidentes, doenças ou outras maleitas, foi dos que mais pagou, dos que mais saiu prejudicado.
Enfim, hoje a aposta virou no bom sentido, do vinho verde tinto, vinho único e, parece, inimitável em qualquer região do mundo. As suas qualidades voltam a ser apreciadas, selecciona-se melhor as castas, aperfeiçoa-se a sua confecção, depuram-se os elementos que lhe poderiam deteriorar o aspecto e sabor.
Então o vinho verde tinto voltou a ser o Rei. Pode ser bebido em maior quantidade do que o maduro ou o próprio verde branco, é benéfico para a saúde, para a flora intestinal. E é o que melhor convívio proporciona à volta de umas castanhas ou um outro petisco, para que não caia desamparado no estômago.
Não digo isto com qualquer interesse que o meu vinho é fraco, não é vendável e não sou comerciante. Mas é de toda a justiça louvar quem tanto trabalho tem para o produzir, produz do “bô” e dá de beber ao amigo que, quando aparece, vem sempre com uma sede daquelas de quem subiu o monte a pé.
Por isso dedico este artigo a um grande amigo que o faz do melhor, mas que não indico quem é, porque senão o seu vinho não chegaria para os “amigos de ocasião”. Estou a brincar, apareçam que bebem também. Com bom vinho se fazem bons amigos.

Festa Portuguesa em Martres de Veyre

Quando duas vilas se geminam assumem projectos comuns, intercâmbios que proporcionam relacionamentos proveitosos para ambas.
Apesar da diferença de meios, da diferente estruturação do poder local em Portugal e França, Arcoselo e Martres de Veyre prosseguem na sua atitude de fortalecimento dos laços que já as unem.
Com este propósito deslocou-se a Martres de Veyre uma delegação da Vila de Arcoselo, tendo sido assinado, pelas respectivas Associações de Geminação, um protocolo para a área da educação que pretende desenvolver o intercâmbio juvenil.
Estas duas vilas têm uma dimensão territorial e populacional, estruturas sociais e educacionais semelhantes e, como seria de esperar algumas características diferentes.
Se é verdade que em Arcoselo a agricultura nunca foi actividade exclusiva e deixou de ser dominante há uns trinta anos, em Martres de Veyre, estando na zona de influência da industrial Clermont-Ferrand, a viticultura, como sua actividade preponderante, já há muito foi abandonada.
Se é verdade que Arcoselo tem uma zona histórica que integra a Zona Histórico de Ponte de Lima e mais alguns lugares com características urbanas, Martres de Veyre tem uma Zona Histórica própria, muito antiga e concentrada.
Tem uma particular beleza as suas ruas floridas e os seus “impasses”, ruelas sem continuidade que constituem bonitos recantos, aconchegados para o Inverno, acolhedores no Verão.
Os portugueses que demandaram estas paragens, muitos há quatro décadas, estão perfeitamente integrados nesta vila, nesta sociedade tolerante e receptiva às diferenças culturais, característica francesa que tem aqui um expoente dificilmente ultrapassável.
Nota-se que há uma conjugação de esforços para que a comunidade portuguesa, estando bem integrada, não seja assimilada e para que não perca as suas próprias idiossincrasias, antes para que as preserve e valorize.
Esta ligação a Arcoselo é vital para manter aquele vínculo às suas origens, aos usos e costumes que os franceses não rejeitam e até a alguns dos quais, de bom grado, aderem. A sua alegria em participar numa festa dos portugueses, realizada no decorrer desta visita, foi evidente.
Vital também é que as gerações futuras continuem a falar português. Se isso está garantido aqui na segunda geração, já será mais problemático a partir da terceira, sendo esta já, em muito, resultado de ligações matrimoniais entre elementos das duas comunidades. Além do querer será necessário apoio.
Também nas escolas públicas francesas o espanhol já suplantou o português. Há pois que fazer grandes esforços para que comunidades como esta, que tão arreigadamente querem manter os seus laços à terra e usar a sua língua, o possam fazer.
Estas viagens, como a desta delegação da Associação de Geminação Arcoselo - Martres de Veyre, não são um desperdício, mas antes mais um contributo válido para manter viva a chama de portugalidade que os franceses também se empenham em que seja mantida acesa no seu seio.
Martres de Veyre não é Paris mas brilha no coração da França, tão perto do Puy-de-Dôme, nesta região do maciço central francês onde a alma francesa tem a sua manifestação mais profunda. Aqui tão perto, em Gergovie, neste vale do Allier, foi onde, pela primeira vez, os gauleses comandados por Vercingétorix venceram as hostes romanas de Júlio César.
O vale do Allier, afluente do Loire, é de uma beleza surpreendente que se pode desfrutar dos vários montes circundantes, muitos de origem vulcânica, e destaca-se pelo multicolorido dos seus campos de trigo, das suas vinhas e pomares de árvores de fruto, em particular nogueiras, das suas vilas dispersas.
Martres de Veyre, como Arcoselo, não se pode dissociar da beleza que a rodeia. Também neste aspecto, ambas são locais privilegiados, usufrutuários de paisagens magníficas e deslumbrantes, cuja contemplação liberta a alma para a sua verdadeira função: a espiritualidade.
Neste relacionamento entre Arcoselo e Martres de Veyre é a comunhão espiritual que prevalece. Não existe qualquer artificialidade, antes parece que já nos conhecemos há séculos e que esta amizade perdurará enquanto em Martres de Veyre houver algum sangue arcoselense.
E, a avaliar pela determinação e empenho dos que vivem em Martres de Veyre, que também são de Paredes de Coura, Viana do Castelo, Santo Tirso, Póvoa do Lanhoso e doutras terras, o sangue português nesta linda terra de França não se prevê que deixe de existir.
Se estes portugueses são os “ponta de lança” da nossa maneira de ser e da nossa cultura, nós não os podemos nunca atraiçoar, antes temos de constituir para eles um esteio bem forte, a fonte e que mereça continuar a ser o destino dos seus sentimentos mais nobres.

sexta-feira, 3 de novembro de 2006

A Escola na glorificação e na segregação

A escola hoje não é um patamar na vida de um homem mas um conjunto complexo deles, com diferentes objectivos, destinados a idades específicas, com formas organizacionais próprias e avaliações com critérios e exigências particulares.
Tem sido norma, comummente aceite, a tentativa de uma melhor adequação do tempo dedicado à escolaridade, de adaptação dos métodos e das actividades praticadas na escola à vivência própria da idade dos alunos, de modo a que haja um percurso paralelo ou o mais convergente possível.
Paralelamente atende-se cada vez mais ao papel da família na educação, à medida que, contraditoriamente, a família tem cada vez menos tempo e disponibilidade, até mental, para dedicar aos seus filhos.
A escola vê-se na contingência de assumir nova tarefas. Por exemplo, se a família não tem possibilidades de ensinar música, e é a família, e por extensão a sociedade, que cada vez mais faz essa exigência, é o Estado que tem que facultar essa possibilidade. Aliás a família está, no geral, bastante distante do contexto em que os seus filhos se movimentam.
Mas a partir de certa altura começa a ser problemática a capacidade da escola em acompanhar o desenvolvimento dos seus alunos e de ter o poder de dar satisfação a todas as possíveis exigências, muitas não suportáveis no contexto escolar.
Se nós olharmos umas décadas atrás verificamos que a fase de maturidade ou pelo menos de assumpção de muitas responsabilidades sociais se atingia em idades em que hoje ainda só se estuda e se não pensa dar esse passo.
Mas o natural é que os alunos vão tendo que dar resposta a novos estímulos externos, da sociedade e a novos apelos interiores, do seu próprio ser. Para eles vai-se tornando cada vez mais premente a necessidade de uma certa independência, de ter um poder de iniciativa que lhes não é facultado.
E as dificuldades vão surgindo em ignorar esses estímulos, controlar esses apelos e conciliar as exigências do estudo, a dependência económica, o adiamento do “ser” com a promessa de uma saída airosa para a “vida real”.
Quando o sistema escolar está estruturado em patamares, mas só se concebe uma saída pelo topo, quando a família não tem qualquer possibilidade de ver os seus filhos aí chegar, o desinteresse em atingir qualquer ponto intermédio generaliza-se, a perspectiva para os alunos vai-se deteriorando.
Se virmos o problema na perspectiva única da família verificamos que, se esta é de todo disfuncional ou se tem tempo mas não tem saber ou se tem saber e não tem tempo, é só quase da capacidade única dos filhos que depende algum sucesso escolar e algum do seu sucesso na integração laboral e social.
É em relação a estes alunos que vivem num contexto familiar desfavorável que mais se exerce a influência negativa que resulta da falta de sintonia entre um percurso normal de vida e o percurso escolar que, um pouco contra-natura, foi incrustado naquele.
Em cada patamar do estudo se vai pondo o problema de saber se este vai ou não ser o último. E tendo isto a ver com a capacidade da família, a sua cultura própria, o relacionamento interno dos seus membros, o aluno é o primeiro a se aperceber se há efectivo apoio para que possa fazer a sua inserção imediata na vida activa ou para a protelar por mais uns tempos.
Haverá sempre uma altura em que os alunos têm que sair da escola, abandonar esse mundo descaracterístico e artificial e enfrentar o mundo do trabalho. E cada vez mais a escola tem que estar preparada para deixar sair do seu seio alunos capazes de se confrontarem com essa mudança e de se adaptarem às novas exigências que se lhes vão deparando.
A adequação dos patamares do ensino aos ciclos normais da vida da criança, das fases da adolescência e de uma certa mas imprecisa maturidade seria um passo importante para que a mudança para a vida laboral se não fizesse a meio de ciclos e houvesse uma melhor transição.
Não há qualquer drama em nem todos saírem pelo topo do sistema. Nem todos podemos ser “Doutores”. Mais, a sociedade não preciso só de “Doutores”. A escola tem que incluir para os que acabam a escolaridade obrigatória e para o final de cada um dos patamares seguintes uma forma de inserção dos seus alunos no mundo do trabalho, numa vida social mais ampla do que aquela a que, enquanto estudantes, estariam habituados.
Continuarão a existir, por força da divisão do trabalho, tarefas que poderão ser desempenhadas com igual dignidade por aqueles que não possam ou não queiram “suportar” tantos anos de escolaridade. Mas que têm direito a ter uma habilitação intermédia valorizada e exigente.
O Estado não pode, mercê da deficiente estrutura em patamares da escolaridade que nos faculta, dando exagerada importância ao topo e deixando a parte que constitui o cerne do sistema no maior desleixo, contribuir para uma abusiva estratificação social, em que o que conta é ser “Doutor”.
O Estado tem que tudo fazer para, com o mínimo de interferência na vida familiar, dar igualdade de oportunidades a todos. Há percursos escolares que, em princípio, não estarão ao alcance de muitos, por razões económicas e familiares, mas uma interferência na família pode repercutir-se na sua harmonia.
Acima de tudo o Estado tem de proporcionar saídas dignas. Todos os que, por terem menos capacidades ou por qualquer outra razão, vão terminando o seu plano de estudos, merecem igualmente sair dignificados, para que não haja ninguém segregado.
De qualquer forma o alcance de mais um ou menos um patamar no percurso escolar não pode ser motivo de discriminação, sendo que hoje essa ameaça é usada como incentivo para os alunos mais novos ambicionarem ir mais além.Infelizmente a segregação não começa quando o “filho da mamã” atinge o ambicionado “canudo” mas quando lhe é incutido, enquanto criança, que se não obtiver o dito não é nada na vida. E mais, quando nunca se lhe chega a dizer que se pode estar a criar um “monstro”. E há tanta gente digna sem “canudo”.