terça-feira, 31 de outubro de 2006

Os Cibernéticos da casa não fazem milagres

Há uma máxima que sentencia que “Santos da casa não fazem milagres”. Se assim é, é porque esperamos conflitos. Mesmo assim não podemos ver esta situação sobre uma óptica depreciativa, porque é muito natural que nós tenhamos mais conflitos com as pessoas com quem mais convivemos.
Esta máxima pode-se ainda alargar um pouco e aplicar aos Santos da beira da porta, aos da aldeia, aos da terra e por aí nos havemos de ficar. Claro que agora há Internet e, caminhando pelo ciberespaço nós chegamos ao mundo, mas este tem mais com que se preocupar do que connosco.
Vai daí, aquilo com que temos de nos preocupar mesmo é com a gestão dos conflitos caseiros, de vizinhança, de aldeia ou da terrinha. No fundo é das pessoas com que interagimos nestas áreas restritas que esperaríamos o milagre de não haver conflitos. Com as mais longínquas já só haverá conflitos virtuais.
Um bom milagre já é a ausência de conflitos reais. Mas estes surgem e se não houve solução para os não criar, há que contribuir para os não empolar ou para os ignorar.
Se muitos nascem sem pernas para andar outros depressa atingem o seu apogeu. Então só resta relativizar a sua importância ou encontrar a sua solução no contexto em que foi criado. É difícil, porque as pessoas não querem regressar aí.
O que complica ainda mais a situação é que muitos conflitos que se pensa terem sido agora criados, têm as raízes no passado, em outros conflitos não resolvidos e não necessariamente da mesma natureza. Muitos são resultado de revanches, vinganças que nunca encontrarão solução.
É lamentável que a Internet seja usada para criar ou avivar conflitos. Muitos já constataram que é o meio mais cómodo para aferroar uma pessoa ou lança-lhe umas farpas que a vão maçando. O que prova que os pensamentos mesquinhos são os primeiros a aproveitar as novas oportunidades.
Sendo um meio com pouca repercussão pública não deixa de provocar os seus efeitos nas mãos de pessoas assim. Um meio aberto à mais ampla consulta seria idealmente bom que lá revelássemos o que temos de bom, as soluções que congeminamos para o que temos de mau e não andássemos a inventar intenções, quando não factos que não correspondem à realidade.
Ninguém vai andar a navegar à procura de conflitos de pouca dimensão, mesmo de quem se possa julgar o centro do mundo. Mas os mais conhecidos é natural que dêem alguma importância e isto lhes sirva para satisfazer algum capricho. Mas também podemos levar este mundo a sério.
Assim não nos podemos admirar por aquilo que se passa neste mundo ainda um pouco lateral, como que escondido às vistas de quem ainda é o nosso homem-padrão, que é sempre para ele, tendo-o em mente, que nós escrevemos.
Ora esse homem, seja o que temos, seja o padrão de sociedades mais evoluídas, nunca será um assimilador activo de novas ideias, pela adesão vinculativa da sua inteligência, da sua emotividade e quiçá da sua afectividade.
O homem “normal” antes procurará sempre alguém que, por ser portador de determinado sistema de ideias e princípios o possa vir a representar a cada um dos vários níveis em que é solicitada a sua intervenção.
Os nossos políticos com blog não ignoram que são virtuais representantes de alguém, pelo que são políticos na acessão mais ampla da palavra. Pretendentes a integrantes dum sistema de representação são evidentemente.
Como muitos já o foram, são geralmente considerados assim e não restarão dúvidas que agem como candidatos a tal. O que atrapalha um pouco estes candidatos é que os que têm passado não se querem responsabilizar por ele e os que o não têm brincam com o presente.
Mas com o presente só brincarão se nós deixarmos. Mentiras e conclusões erróneas e abusivas não serão por mim aceites quando se faça uma referência implícita ou explícita em relação àquilo que eu escrevo nestas páginas ou noutras.
Escuso-me a voltar a apreciar um prato requentado, trazido dum blog do Sr. Nuno Matos para este Jornal. Como a “polémica” na blogosfera já vai num outro patamar, de certo mais elevado, recuso-me a repô-lo a um nível que eu abomino.
Pelo que escrevi acima acho que já será explícito que não morro de amores pela blogosfera, que não me escuso a qualquer polémica em qualquer ambiente desde que não haja argumentos cruzados provindos de ambientes diferentes e sinceramente aprecio mais a comunicação escrita e impressa.
Ah! E utilizem os meus comentários para me atacarem a mim, para porem em causa possíveis incongruências e inverdades, mas não para atacarem quem neles não é citado.

sexta-feira, 27 de outubro de 2006

A autoridade e os grupos em contexto escolar

No nosso País a sociedade tem muito pouco peso e está permanentemente à espera que seja o Estado a resolver todos os problemas. E este lá vai tentando chegar a todo o lado, omnipresente, que não seja doutra maneira, pelo menos pela sua notada ausência.
O Estado moderno estruturou-se há pouco tempo e ainda estamos longe de uma correcta afectação de recursos. Vão-se fixando prioridades, aqui e ali, a educação é daquelas que, de tempos a tempos, salta para os primeiros lugares.
Só que quando assim é nem sempre as soluções encontradas encontram receptividade e as sondagens feitas com dados reais nem sempre correspondem à expectativa criada. Quando se não sabe bem aquilo que se quer, pedem-se e rejeitam-se as coisas quase aleatoriamente.
Analisando a nossa situação em relação à educação e em termos comparativos, têm-se chegado à conclusão de que estamos bem pior do que devíamos. E se admitirmos que o Estado algo tem feito para inverter esta situação, concluímos facilmente que as resistências são tais que a sua acção resulta ineficaz.
Há uma conjugação de interesses instalados com a falta de perspectivas para colocar estas questões, com visões unilaterais e restritas. Tais manipulações fazem com que aquilo que noutros lados foi reivindicado seja cá rejeitado.
E para cúmulo não se trata aqui de investir muito dinheiro mas, de modo principal, empenho, perseverança, disciplina, rigor. Conclui-se facilmente que o Estado não tem sabido o que fazer ou não tem poder para fazer o que se impõe.
Acresce que a educação é um assunto em que o papel do Estado é fundamental e o papel da sociedade passa por ter que ser exigente. Para esta a principal questão é a necessidade de se organizar para colocar exigências claras e saber reivindicar o seu cumprimento.
Longe vão os tempos em que os conhecimentos eram comunicados de pais a filhos e tanto chegava. Hoje em dia os pais já não têm tempo para isso e transmitir todos os seus conhecimentos obrigaria a um exagerado dispêndio de tempo e energia, necessários para garantir o sustento da família.
Acresce ainda que tal, de modo algum, garantiria que esses conhecimentos seriam aqueles de que os seus filhos precisarão quando forem “grandes”, isto é, quando precisarem de angariar os seus próprios rendimentos.
Então aqui sim tem de ser o Estado a definir quais os conhecimentos que devem ser administrados aos alunos e a preparar e pagar a quem lhos ministre. E aos alunos impõe-se que para os adquirir se tenham que juntar em escolas para que o preço do ensino não saia incomportável.
A responsabilidade do Estado é neste domínio de tal modo importante que não se coaduna com o deixa andar que lhe é característico, com o desleixo e com a sua entrega por renúncia a sindicatos ou a gestões “ditas” democráticas.
O Estado tem uma responsabilidade de carácter técnico, organizacional mas também de adequar o ensino às necessidades da economia, da formação humana, da convivência fraterna, da transmissão dos valores culturais mais apropriados às exigências do futuro com a manutenção das características essenciais do homem.
Ao Estado cabe fazer a selecção dos valores em que assenta o “seu” ensino e a preparação das pessoas para que todas elas tenham o seu devido lugar no futuro. Aos agentes do ensino tem que ser exigido o seu envolvimento nesta tarefa.
Ao Estado cabe fazer a agregação de gestores, professores e outros agentes para que nas escolas públicas se faça educação. Todos os profissionais envolvidos têm que ter sempre bem presente na sua mente que “aqui” quem tem direito a ter problemas são os alunos.
Estes, durante todo o tempo da sua escolaridade, e em grande parte dos dias, vêm-se bastante desligados do meio familiar e deparam-se com múltiplos problemas de que destacarei: a transferência de autoridade, a necessidade de contextualização da sua vivência escolar; a convivência dos múltiplos apelos que lhe surgem com um horizonte temporal passado, e possivelmente futuro, estratificado e orientado em sentido diferente do seu.
A escola como local hoje imprescindível para a socialização e transmissão de conhecimentos, se comporta por esta razão elementos altamente positivos, comporta também elementos cujos efeitos são deveras negativos.
Por exemplo a autoridade escolar, exercida por dirigentes, professores e outros agentes escolares, é vista pelos alunos como uma extensão da autoridade paternal e se esta se não exerce pacificamente não é de maneira nenhuma pacífica a sua transferência para a escola.
Raramente os alunos reconhecem aos agentes escolares a autoridade que não reconhecem aos pais. E se estes pais não conseguem exercer a autoridade mínima que se imponha na educação dos filhos também raramente o reconhecem
Quando os alunos deixam de ver a autoridade escolar como um extensão da autoridade paternal são tentados a tentar explorar em seu favor essa dissonância. À escola é imposto que mantenha esse vínculo nem que ele já só seja virtual ou mesmo que a família tente transferir para a escola a “culpa” dos problemas de sociabilidade dos filhos e não assuma a sua “culpa” original.
Seria necessário um esforço comum para que a escola e a família conseguissem ultrapassar os problemas sem curar de procurar essas “culpas” mas tão só responsabilidades da situação, para que fosse possível estudar soluções.
Quando a escola é incapaz de estabelecer esta cooperação e por si só não tem os meios para reencaminhar os alunos com problemas, estes criam entre si uma contextualização em que é preponderante uma cultura grupal anti-social, anti-disciplina, anti-qualquer ordem que não seja a definida pela estrutura que consigam dar ao seu grupo ou por qualquer outro que seja tido como exemplo a seguir.
Então, se não é possível que os membros desses grupos reformulem os valores em que eles os assentam, a única maneira de tentar resolver o problema é a sua desagregação “física” e o impedimento da sua nefasta acção.
Mas não só os “insurrectos” formam grupos. Na contextualização que é feita pelos alunos em relação à sua vida escolar, quase todos integram grupos, mas quanto a vida escolar dos seus membros mais desligada estiver da sua vida familiar mais dá origem às tais formações grupais problemáticas.
Embora “os filhos da mamã” não estejam de todo “isentos” de criar o seu próprio contexto diferenciado mas integrável, ou seja de natureza grupal, são muitas vezes vítimas do isolamento, outro grave problema de socialização.
Por todas estas razões, também é função da escola contribuir para a formação de grupos (não para a selecção de pessoas) com culturas positivas, de modo que estes, sem roturas e até sequer sem ressentimentos, possam assumir a liderança em detrimento doutros com culturas negativas, que têm tendência a assumir a preponderância na cultura da escola.

terça-feira, 24 de outubro de 2006

A frágil garça entre a águia e o abutre

Sempre tenho dito que a “coisa” mais relativa que há é o gosto e que é o gosto que nos liberta, nos dá personalidade e valor. Mas não adiro à teoria do bom gosto, qualquer que seja o entendimento que sobre isso se tenha, muito menos quando se entende por tal algo bem definido e intocável.
Sendo humano tenho o meu gosto, nem bom nem mau, relativo como o dos outros humanos, e, nestas lides “croniqueiras” de comentarista, para simplificar, como convém, associei o meu gosto ao espírito leve mas não leviano da garça.
Uns queriam que eu fosse uma águia, voando triunfante sobre a presa, capaz de repentinamente picar sobre a triste vítima que assim acabaria morta e dilacerada. E, qual parvalhão eu fosse, aparecia com mais uns tantos pilantras que me acompanhassem a gritar bem alto: vitória!...vitória!
Outros queriam que eu tivesse a espírito do abutre, tivesse a calma de um monge e a paciência de um pajem, suficientes para esperar que alguém se encarregasse de matar a vítima e, prostrada que ela fosse no chão, já meio esventrada que estivesse, cairia calmo e pachorrento sobre ela, só tendo então que me preocupar com que os outros abutrezinhos me não tirassem o meu quinhão.
Outros ainda quereriam que eu não existisse, que a existir estive quedo e calado, que o jogo corre o risco de ficar baralhado e a vida correria bem sem mim. A esses pouco interessa o saber, antes interessa o poder, o comer e outras coisas mais, com certeza. Mas a estes eu não ligo patavina.
Eu sei que, infelizmente, a maioria das pessoas têm espírito de abutre, que a experiência diz, por exemplo, que o poder autárquico não se ganha, perde-se, que é preciso esperar. Mas eu não estou aqui para fazer politiquice barata e acho que até já é tarde para muita gente perceber isso.
Aqueles que têm ambições a águias, que são muitos, e que se preocupam fundamentalmente em ganhar posição à partida, que tem imensa dificuldade em lançar o seu voo, no geral vão desprezando os outros, mas se aparece um mais destemido, porque acham que alguém tem de fazer o trabalho duro, que seja esse a fazê-lo.
Para não gastar energias, que a águia gosta de atacar pelo seguro, nada como alguém que faça o trabalho de sapador, levante a caça, faça estardalhaço onde o bom repasto possa surgir. O problema é que muitos daqueles abutres que se querem passar por águias, poucos têm arcabouço para o virem a ser e nem conseguem sequer convencer os amigos.
Não é águia quem quer e se vemos o repasto aparecer abocanhado por alguns é porque esses tiveram a arte de se colocarem no local exacto, no momento exacto, para que as ditas presas, fugindo às águias-reais, lhes possam vir a entrar pela boca dentro. Já algum mérito terão porque os abutres, esses que não fazem um esforço para se levantarem, só lá chegam pelo cheiro das vísceras.
No meio deste panorama avícola que prazer imenso em me identificar com a postura inteligente, com os pés bem assentes em terra, vigilante e pacífica da garça. O rio chega para todos e a garça tem o seu espaço, não gosta de peixes mortos e não está à espera que qualquer outra garça escorrace os vivos para a sua beira, para os apanhar.
Discutir gostos é muito difícil e prometo não os discutir mais. Sinceramente espero que não ponham em causa os meus gostos com estafados argumentos do género: Não tens envergadura para isto, isto não é do teu domínio, precisas de umas penas maiores, mais vistosas e atractivas para voares como deve ser.
Por sorte, ou por falta dela, o nosso rio é pequeno, os nossos assuntos parecem caber todos na palma de uma mão e por isso os inaptos cedo chegam a conclusão conclusivas, passe a redundância, daquelas de que não vale a pena mexer mais no assunto. Então há imensa gente que diz que tudo já está discutido.
Então a “criatividade” dessas pessoas vira-se para outro lado, para o nacional, para o internacional mesmo, e enchem-nos de sentenças sem recurso que as instâncias que elas congeminam nos seus cérebros já estão todas ultrapassadas.
A garça não se coíbe de fazer alguma referência ao nacional, convencida que está que os maus exemplos sempre proliferam e que os bons dificilmente cá chegam. Mas reconhece que falar destes assuntos é falar de algo bastante distante para muita gente e que se pode aprender também com assuntos que nos tocam de mais perto, mesmo que estejamos alheados deles e os não vejamos.
A garça está convencida que há beleza na areia, na água do rio, no azul do céu, no sorriso, tanto como no ar compenetrado de quem pensa. A garça está convencida que há atracções e aversões epidérmicas que podem provir da educação ou da imitação mas não são racionais e é necessário fugir a elas.
A garça está convencida que não é a natureza do assunto que faz a diferença, mas a maneira como ele é abordado. A garça está convencida que o afecto, a emoção e a inteligência são a trilogia de cuja concordância resultam os seres mais valiosos. Quem se banha com água e não ama a água é um ser incompleto.

terça-feira, 17 de outubro de 2006

Uma estátua controversa e inútil

Há dez anos foi inaugurada, não posso dizer se com muita ou pouca pompa e com muita ou pouca circunstância, porque não assisti, a estátua do Sr. José de Sá Coutinho no Largo de S. João.
Houve alguma polémica acerca da imoralidade da colocação na praça pública de uma estátua oferecida pela família, sem que se manifestasse qualquer movimento de apoio. E a polémica chegou ao mérito do visado, uma personagem a vários níveis controversa.
Se esta família queria prestar uma homenagem particular, colocava a referida escultura dentro da sua propriedade, que não é tão pequena como isso, e tanto bastava.
Se a sociedade se não prestou para assumir esta homenagem é porque o visado não merecia o reconhecimento público. No tempo deste senhor os democratas prestavam homenagem aos seus amigos dentro dos cemitérios.
Se a família quis afrontar a sociedade com a sua brônzea presença na praça pública, no fundo só é mais uma de entre muitas afrontas em que esta família tem sido pródiga.
Ponte de Lima por imposição deste senhor, tal era o seu poder, só beneficiou de uma nova ponte após o 25 de Abril. No início dos anos 60, para tentar remediar o problema da travessia do rio foi, por sua culpa, feito o maior atentado ao melhor e mais antigo do nosso património arquitectónico.
A ponte romana foi desmontada pedra a pedra, foi alargada com pedra nova, cimentada, violentada. E, se se tornou possível o cruzamento de dois autocarros em cima dela, isso não resolveu qualquer problema de trânsito.
Logo à frente na ponte medieval continuou a não ser possível o cruzamento de qualquer veículo com um autocarro e várias pessoas morreram ou foram mutiladas por esse motivo, apertadas contra os amparos da ponte.
O senhor em causa procedia assim porque tinha larga influência e era um fundamentalista político e um saudosista da paisagem natural e humana, que queria imutáveis. Mas acima de tudo era mais um herói contra o progresso, nem que esse combate passasse pela delapidação do património.
Escreveu lindos roteiros, descreveu paisagens, mas a sua ambição era que tudo ficasse assim para a eternidade. Algum mérito a sua escrita terá, mas nada que lhe dê direito a pedestal, porque não criou “humanidade”.
Matas como a deste senhor estão, noutras terras, há muito tempo ao serviço da população. Em Ponte de Lima trata-se como uma “vaca sagrada” em que se não mexe. É a sombra tutelar sobre Ponte de Lima, representação do poder que lhe permitiu colocar como Presidente da Câmara um seu “escudeiro”, que mal sabia escrever.
Agora a família opõe-se à construção de um multiusos no chamado “Campo do Ciclo” porque lhe estragaria a paisagem das janelas da casa. Vendeu bem terrenos à Câmara Municipal para fazer parques de estacionamento, que os carros são baixos e não lhe estragam os miradouros.
Bem pior tem feito esta família a Ponte de Lima do que D. Teresa. Esta Senhora deu-nos direitos, outros estatuados tiraram-nos. Esta Senhora exerceu as suas funções com a legitimidade que ao tempo lhe era atribuída. Outros, sem legitimidade para tal, têm sido os senhores de Ponte de Lima.
Não se podem fazer arrazoados e não se ficar a saber se querem apear a estátua de D. Teresa por falta de mérito ou por má colocação. E ainda se não ficando a saber se lhe faltam méritos na acção política, pela qual indubitavelmente nos concedeu privilégios ou por nascimento, de que ela não é manifestamente culpada.
Como está por demais provado o nosso sangue tem as mais diversas origens. E, se nem a “nobreza” nem a “realeza” estão de todo imunes a estas miscigenações, isso não lhes tira méritos nem lhos dá.Por isso o meu protesto contra a sanha persecutório contra esta Digna Rainha. Se não a querem ver, virem os olhos para outro lado. Não será por ela, até que se prove o contrário, que Ponte de Lima está carente de Humanidade.

terça-feira, 10 de outubro de 2006

Os incentivos fiscais para a recuperação do Centro Histórico

Para a voz corrente é no domínio da beleza paisagística que os prédios degradados representam uma grande falha.
A Lei define, porém, como degradados os prédios que, face ao seu estado de conservação, não cumpram satisfatoriamente a sua função ou façam perigar a segurança de pessoas e bens. A estética não está aqui em causa.
São, pois, apenas aquelas as razões que nos levam a aceitar a justeza dum agravamento da taxa do I.M.I. para os prédios degradados. A questão estética poder-se-á pôr a um outro nível.
Havendo em Ponte de Lima alguns casos de perigo para a segurança de pessoas e bens, o problema da maioria das casa degradadas prende-se com o não desempenho da função que lhes estava destinada.
Facilmente podemos concordar que se deve desincentivar a compra e posse de património imobiliário a que, à partida, se sabe que se não quer dar o devido destino, mas que funciona como uma espécie de fundo de reserva para fins especulativos.
O especulador, no geral beneficiando de informação privilegiada, deixa andar o marfim até que o prédio venha a cair na ruína. A “sorte”, inopinadamente, bate à porta e aparece então alguém para o comprar com a devida sobrevalorização.
Há, em relação aos bens herdados, alguma injustiça, dado se poder pressupor que o novo dono não foi até aí senhor de dar outro destino ao prédio em causa. Mas a verdade é que os bens existem para exercer uma função e nós não somos de todo senhores absolutos de bens inseridos em estruturas construídas com objectivos sociais definidos.
Embora se possa invocar o princípio da igualdade fiscal, para que não fosse só o Centro Histórico o atingido pela medida adoptada pela Assembleia Municipal de Ponte de Lima, é neste Centro que a questão é mais premente.
Mas também, por este facto, esta medida deveria ser acompanhada por um incentivo à reconstrução dos referidos prédios. Os incentivos previstos deveriam ser aplicados.
Sendo na sua maioria destinados a arrendamento, podiam beneficiar de uma redução de 20 % da taxa a aplicar depois de recuperados.
Aliás a Câmara poderia definir uma operação de reabilitação urbana da zona histórica e de combate à desertificação, o que permitiria uma minoração de 30 % da taxa, cumulativa, nos casos de arrendamento, com a redução anterior.
Assim muitos prédios da zona histórica poderiam beneficiar de uma redução para metade do imposto a pagar, o que seria justo dada a menos valia que hoje a sua situação representa.
Viver na zona histórica já não é atractivo, tanto em termos de condições habitacionais, como de aparcamento e guarda de carros e o comércio e serviços também de cá fogem.
Só a redução de impostos, as rendas mais baixas, a captação de jovens poderá reactivar uma zona que, a não ser assim, morrerá quando a minha geração, que ainda gosta destas coisas, acabar.
Além do mais esta redução não seria excessiva face à penalização que, por efeito do índice de localização de 1,1, lhe é aplicável. Refira-se que a maioria do município tem um índice de localização somente de 0,5 ou 0,7.
A este propósito direi, tão só, que o índice de localização de um prédio é determinante para o cálculo do seu Valor Patrimonial Tributário, ao qual se aplicam as taxas do Imposto e que assim influencia o montante a pagar.
O I.M.I. pode pois ter uma função social e urbanística, quando se não quer ficar só por aquilo que salta com mais evidência aos olhos das pessoas, que é a degradação de muitos prédios na nossa Vila.Deve-se ir mais além do que aproveitar tão só o efeito penalizador da Lei, com a pretensão de amealhar mais uns cobres para os cofres camarários. Devem-se também aplicar os incentivos, até para completar o efeito pretendido.

sexta-feira, 6 de outubro de 2006

UM DIA PELA VIDA – Um Dia de Festa Contra o CANCRO

Trinta e seis equipas durante quatro meses deram largas à sua imaginação, conjecturaram iniciativas, meteram pés ao caminho, solicitaram a adesão da população, fizeram pedagogia “médica”, demoveram más vontades e conseguiram um honroso resultado, coroado com uma festa conjunta que decorreu com imenso sucesso no dia 1 de Outubro passado no Parque de S. João.
Não se tratou de um peditório, como é normal a Liga Portuguesa Contra o Cancro fazer anualmente, mas sim de um conjunto de eventos de natureza diversificada, que tiveram em comum somente o objectivo último de angariação de fundos para levar a cabo as suas meritórias actividades.
A principal característica desta acção é a existência de uma contrapartida, material ou não, que não seja outra é a participação numa sessão de convívio como um passeio a pé ou de bicicleta.
Cada equipa era livre de escolher, segundo a capacidade dos seus membros e as possibilidades do meio em que está inserida, o tipo de iniciativas que mais se coadunava com essas características.
Umas iniciativas tiveram sucesso outras menos, umas não falharam outras não conseguiram ultrapassar as suas contradições. O resultado final é agradável no seu conjunto mas seria bom que cada equipa fizesse um balanço, não para ser criticada na praça pública, mas para que se analisassem os seus sucessos e fracassos, com vista a aprender para iniciativas futuras e que outros também encontrassem aí ensinamentos para ultrapassar as suas debilidades.
Porque nós não queremos, e está no espírito de quem lançou este programa, que isto acabe por aqui. Não se trata de ir já a seguir, aproveitando o efeito de balanço criado, fazer outra realização do género, mas tão só de estarmos disponíveis para participar, para partilhar, para nos envolvermos em correntes que se venham futuramente a constituir com objectivos tão dignificantes como este.
A luta contra o cancro é uma luta já de décadas e que tem mobilizado imensos recursos do Estado, da sociedade, das empresas, das pessoas. Em Portugal há, dada também a nossa sempre relativa carência de recursos, o hábito de atirar para cima do Estado a responsabilidade por tudo.
Mas se nós somos pobres, o nosso Estado não pode ser rico. Além de mais nas iniciativas com “selo de garantia” como esta sabe-se para onde o dinheiro vai, tem destino certo e o Estado, na afectação de recursos, comporta-se por vezes de modo imprevisível e ineficaz.
Temos de acreditar em nós, em que a sociedade é capaz de gerar em si estruturas mais flexíveis que o Estado e que melhor consigam atingir os altos objectivos que aqui se pretendem, de apoio à cura e aos doentes afectados.
A luta contra o cancro vai ser longa. Prevê-se, como foi salientado pelos responsáveis da Liga, que a incidência do cancro vai continuar a aumentar, embora se acredite que os meios para o combater serão cada vez mais eficazes.
A prevenção e o primeiro diagnóstico têm que ser os métodos mais usados porque a minimização dos danos, o tratamento de um cancro instalado, terão cada vez mais sucesso mas, embora se tente caminhar para lá, um processo canceroso dificilmente será totalmente revertível.
Esta iniciativa contribui, e de que maneira, para colocar mais alerta a população face à realidade e à possível evolução da doença. Contribui para alargar o espaço de solidariedade e até para a satisfação pessoal dos que, de qualquer modo, nela se envolvem.
Se mais de quinhentas pessoas intervieram directamente através das equipas, outras quinhentas, de entre bandas de música, ranchos folclóricos, tunas, coros, grupos de bombos, cavaquinhos ou concertinas, grupos musicais e teatrais, cantores ao desafio, fadistas, terão passado pelo palco para que a festa não esmorecesse nas suas mais de 13 horas de duração.
Todos contribuíram graciosamente, culminando com um magnífico fogo de artifício que, acho eu, até serviu para demonstrar que com menos alarido se faz um bonito espectáculo.
Ademais todos os artistas deram do seu melhor enquanto a corrente humana, a Volta dos Sobreviventes, se manteve ininterruptamente de princípio ao fim, como afirmação do empenho sem desfalecimento de todos nesta luta contra a doença.
Na enorme mesa em redor da qual se dava esta Volta foram colocadas luminárias e pelas 21 h realizou-se uma cerimónia, com o testemunho de um sobrevivente, um poema de Torga, um minuto de silêncio e o hino de “Um Dia pela Vida”, simbólica homenagem aos que partiram.
Quem assistiu, em especial à parte final desta festa, só pode ter ficado com os sentimentos de regozijo por ter participado, de culpa por não ter contribuído, quiçá por ter recusado 1 € por estacionar, como infelizmente aconteceu com muitas pessoas numa iniciativa em Agosto no areal de Ponte de Lima, ou um sentimento de desconforto por até ter usufruído duma festa para a qual o seu contributo foi pouco mais que nenhum.
Com certeza que se tudo começasse agora sairia melhor, que haveria maior participação e empenho. Mas esperemos que o exemplo frutifique e que quem o siga o faça também com a transparência deste, com a sua clareza de objectivos, com a nobreza da sua causa.
“Um Dia pela Vida” foi uma digna manifestação da disponibilidade que há em nós para sermos solidários.

terça-feira, 3 de outubro de 2006

Viva o S. João de Arga, ó-ai-ó-la-li-ló-le-la

Eu gosto em particular do Santo Aginha. E lá vai ele, tal qual o seu companheiro São João. Os dois igualmente triunfantes nos seus floridos andores. O São João com uma cascata a seus pés.
Cada qual vai aos ombros de quatro valentes, que bem se esforçam para glória de Deus. Os restantes homens da aldeia vão ao palio e com as cruzes. As mulheres tratam do resto.
Na procissão há muitas bandeiras só na mão de mulheres, senhoriais nos seus fatos de lavradeiras. Chegada ao cruzeiro, a procissão lá vem de volta à capela deste hospitaleiro Convento que os eremitas ergueram neste sítio abrigado e acolhedor duma inóspita mas deslumbrante Serra de Arga.
Gosto dele, deste popular Santo Aginha, também denominado Santo Oginha, que eu até prefiro mais. Santo sem ser beato, intruso nos mais lídimos ficheiros canónicos, terá praticado alguns “crimes” para sobreviver. Arrependido haveria que dedicar o resto da sua vida a ajudar os outros.
O nosso Santo não seria acreditado na sua bondade. Morreu perante a impiedade humana que continuou a ver nele mais o lado “mau”, do que o seu coração de “bom” homem. Alguém se terá arrogado o direito de ser seu algoz e o colocou nestes brejos à mercê dos lobos.
O povo fê-lo Santo, que nesta terra tão agreste é difícil conceber alguém que ainda tenha alguma coisa para dar aos outros, se já há tão pouco para cada um.
A Serra de Arga é mesmo um grande maciço granítico só cortado por esta fenda virada a norte, rumo ao rio Coura e encimada pelo convento de Santo Oginha. Nas suas costas este rasgão na Serra vira a sul rumo à Montaria.
Depois a Serra tem pequenas fraldas de rochas de diferente natureza, na idade e contextura, onde se já permite alguma agricultura, como o Cerquido, as Argas de Cima, de Baixo e de S. João, Dem e Montaria. Só depois veio o minério e a partida para Lisboa e para o estrangeiro.
São os habitantes da Serra, de parcos recursos, que mais vivem a festa. Mas se ela é vivida com entusiasmo e devoção pelos que cá mais perto residem, também trás cá gente de todo o lado, até onde chega a merecida fama dos seus folguedos.
Caminha, Cerveira, Ponte de Lima e Viana são a origem do maior número de “peregrinos” que todos os anos fazem deste lugar tão recôndito o local do seu encontro e confraternização.
As rusgas que dantes chegavam cá a pé, subindo e contornando agrestes penhascos, continuam a aparecer, animando quem já cá está a juntar-se à dança.
Quem não dança canta e nas Argas há uma maneira peculiar de cantar poemas compostas com mestria, em que o último verso de cada quadra se repete, seguindo-se o refrão a que acima nos referimos.
Já há muitos anos que duas bandas de música, com as suas rapsódias de música ligeira e popular, dão ao ambiente quase familiar propiciado pelos quartéis à volta, uma euforia inusitada de quem, estando neste lugar remoto, se esquece, por estes momentos, de todas as agruras que a vida lhes possa “proporcionar”.
Pela noite dentro a festa continua, de um lado as concertinas, do outro tocam as bandas de música, umas e outras com os seus aderentes entusiastas, empolgados com os seus acordes. As palmas soam estridentes.
Se não se fica para a manhã, que haverá nova procissão para terminar a festa, regressa-se a casa, cientes que com esta animação também é um pouco mais de paz que se adquire, que o espírito necessita de se alimentar e o coração agradece.
Para o ano Santo Oginha de certo que nos terá de volta, não fosse também esta uma forma de adoração face a todos que, na sua bondade, são os incompreendidos deste mundo.